Um evento sem ânimo feito para cumprir apenas um ritual protocolar. É essa a impressão que se teve da tão anunciada convenção nacional do PSDB, ocorrida no final da manhã deste sábado, 12, em Salvador (Bahia), e que oficializou a candidatura do ex-governador de São Paulo, José Serra, à Presidência da República. Como é de costume, Serra chegou com 45 minutos de atraso ao evento e, depois de quatro falas anteriores à sua (do candidato do DEM ao governo da Bahia, Paulo Souto, de Fernando Henrique Cardoso, de Sérgio Guerra e de Aécio Neves), finalmente fez um discurso insosso durante também 45 minutos.A insistência de Serra nos 45 minutos (tanto do seu atraso quanto da duração do seu discurso) talvez tenha sido justificada por algum tipo de rompante místico do tucano, já que o lançamento de sua candidatura ocorre dentro de um contexto nada favorável, a começar do próprio local onde se realizou o evento. A convenção foi feita, neste sentido, no Clube Espanhol, um dos mais tradicionais de Salvador e situado na Avenida Ocêanica, bem em frente à Baía de Todos os Santos. Com uma vista privilegiada, o local até poderia ser adequado, não fosse o pequeno detalhe de que a convenção do PSDB foi o último evento feito ali, já que na segunda-feira (14), o clube será demolido.
Isso mesmo: para desespero de qualquer pessoa mais mística do meio tucano – e dizem que o candidato do PSDB paulista ao Senado, Aloyzio Nunes Ferreira, é um deles – o PSDB escolheu sediar a sua convenção em um clube decadente, com infra-estrutura precária, atolado em dívidas trabalhistas e inadimplência dos sócios. Isso é o terror para qualquer pessoa mais mística, que acredita que os fluidos do local podem influenciar sobremaneira na energia das pessoas ali presentes e até mesmo nos rumos das ações ali tomadas. Bom, talvez seja essa a explicação mística para o clima insosso e sem graça que marcou a convenção nacional do PSDB: o lugar escolhido não tinha energias muito favoráveis.
Marasmo na convenção tucana não foi surpresa
Contudo, deixando o misticismo um pouco de lado, verdade é que motivos não faltavam para o desânimo generalizado no meio tucano, que acabou se refletindo no próprio discurso do agora candidato Serra. Não é exagero dizer que o único momento que a platéia formada pela “massa cheirosa”, como dito pela colunista da Folha de São Paulo, Eliane Cantanhêde, se viu um pouco mais eufórica foi durante o discurso do ex-governador de Minas, Aécio Neves. Sim, Aécio conseguiu “energizar” mais a platéia tucana do que o candidato oficial, para terror de místicos e céticos. O discurso de Serra, por sua vez, adotou uma tônica previsível: ele falou de sua infância, juventude, exílio e destacou valores morais e “competência administrativa”.
A única novidade no discurso do tucano foi que ele elevou o tom de críticas ao governo Lula, acusando-o indiretamente de aparelhamento do Estado e tecendo críticas à Saúde, Educação e Segurança Pública no país. Mas nem aí Serra foi capaz de ir mais fundo, talvez por se sentir “amarrado” à obrigação estratégica de não poder “bater” diretamente em Lula, já que a aprovação do presidente segue em níveis recordes. O resultado disso? Um marasmo que só não deverá ser maior que aquele que abaterá o ninho tucano após o resultado das eleições de outubro, já que o cenário segue amplamente favorável à candidatura governista de Dilma Rousseff. Como dito anteriormente, motivos não faltam para esse desânimo generalizado na campanha tucana, de forma que procuraremos resumi-los em 3 grandes eixos:
01. Cenário eleitoral da pré-campanha: ao contrário do esperado pela cúpula tucana, o lançamento da candidatura de José Serra à Presidência da República não ocorre dentro de um quadro de vantagem do tucano. Isto porque a petista Dilma mostrou, ao longo de toda pré-campanha, que não é “um poste”, como líderes da oposição procuraram (des)qualificá-la no começo do ano, e vem subindo gradualmente nas pesquisas de intenção de voto, de forma que a mais recente rodada de pesquisas mostra Dilma empatada com Serra, sendo que alguns institutos já mostram a ex-ministra ligeiramente à frente do tucano.
Esse é, sem dúvida, um cenário muito diferente daquele que o PSDB esperava: a oposição projetava que a pré-campanha terminaria com Serra abrindo vantagem sobre Dilma, o que não ocorreu. E, para piorar ainda mais o humor da oposição, não foi somente Dilma que subiu nas pesquisas de voto, mas Serra que vem caindo mês a mês na intenção de votos dos eleitores. Ou seja, enquanto a tendência está extremamente favorável a Dilma, não se pode dizer o mesmo para o campo oposicionista.
02. Amarra estratégica que desfigura identidade política: um segundo fator que vem provocando uma “perda de gás” na campanha tucana diz respeito à imposição estratégica ao PSDB de não poder se apresentar como oposição ao governo Lula, o que acaba desfigurando por completo a identidade política do partido. Ora, à medida que não pode se apresentar como oposição, o PSDB fica sem projeto e sem discurso claro para passar aos eleitores, o que complica ainda mais a candidatura de Serra, pois ela fica refém da chamada “política do armário”, na qual o candidato não pode assumir claramente sua identidade e projeto político ao preço de perder uma fatia do eleitorado.
No começo da pré-campanha, Serra até tentou contornar esse empecilho se apresentando como o “pós-Lula”, mas não deu certo. E cá pra nós, não tem como ser frutífera mesmo uma estratégia dessas, pois seria uma missão hercúlea para o tucano ter que convencer os eleitores de que ele representa a continuidade mais natural do governo Lula do que a própria Dilma, que é sabidamente a candidata apoiada pelo presidente. Ao que tudo indica agora Serra resolveu elevar o tom das críticas ao governo Lula, talvez para testar se “colocando uma perna para fora do armário” ele consiga reverter o quadro desfavorável à sua candidatura. A possibilidade de êxito dessa estratégia parece tão remota quanto a da anterior. Mas diante do atual quadro, o tucano não tem muito a perder.
03. Falta de apoio político: o terceiro fator, de grande peso, que tem minado cada vez mais a energia da campanha tucana diz respeito à ausência de apoio político à candidatura de Serra. Neste sentido, enquanto Dilma conta com apoio do PMDB, do PSB, do PCdoB, do PDT, do PR, do PRB e alguns outros partidos, Serra conta apenas com o apoio do DEM e do PPS e tenta negociar um apoio do PP, atualmente na base aliada do governo Lula. A falta de costura política em torno da sua candidatura impõe a Serra uma menor penetração em alguns estados, onde o tucano tem nenhuma ou pouca opção de palanque, além de significar um menor tempo de propaganda de rádio e TV para sua candidatura.
Não bastasse isso, a candidatura de Serra é oficializada sem que o tucano tenha apresentado um vice aos seus correligionários e seus eleitores. Aécio, que era cotado para assumir o posto, descartou a possibilidade de ser vice de Serra, assim como a senadora do DEM, Kátia Abreu, e o tucano Tasso Jereissati. O ex-governador de São Paulo chegou até mesmo a ensaiar um convite para o senador do PP, Francisco Dornelles (RJ), mas formalmente nunca o fez e o PP parece avaliar que a melhor idéia é se manter neutro no primeiro turno, o que seria uma forma mais eufemística de dizer “não” ao PSDB. Ao que tudo indica, restará ao tucano indicar o presidente do seu partido, Sérgio Guerra, que não terá como fugir da empreitada.
Percebe-se, dessa maneira, que o marasmo já era prenunciado na convenção tucana: sem identidade política, sem projeto, sem discurso político, sem apoio político, sem vice, o lançamento da candidatura de Serra só podia ter um fim mesmo: ser sem graça! E neste quesito, o agora candidato acertou quando disse em seu discurso que “ninguém terá surpresas” com ele. Realmente, não houve surpresas.
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