Cardápio do boteko

terça-feira, 4 de maio de 2010

O Zé Serra que não está no gibi



É interessante notar como as pessoas – especialmente no meio político – podem ser traídas pelas suas próprias palavras. Em um artigo publicado pelo Estadão no último domingo, 2, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou categoricamente que “época de campanha eleitoral é propícia à demagogia”. E não é que FHC tem razão? É impressionante como o discurso demagógico tem permeado a ação de determinados grupos políticos no Brasil – a começar pelos demo-tucanos, do qual o ex-sociólogo faz parte.

Neste sentido, a Folha de São Paulo trouxe nesta terça-feira, 4, uma reportagem a respeito de um “gibi” produzido pelo PSDB, do presidenciável José Serra, que deverá ser distribuído a partir da próxima semana entre os “militantes” tucanos. A idéia é que essas histórias em quadrinhos – trazendo as supostas realizações de Serra ao longo de sua vida pública- sirvam para aproximar o tucano da população em geral, arrebanhando um maior número de votos.

A coordenação da campanha pretende lançar, segundo informações da Folha, quatro volumes desse gibi: o primeiro já foi lançado e discute a paternidade do Bolsa Família (criado pelo governo Lula em 2003). O segundo e o terceiro volumes tratam da Saúde, especialmente na época em que “Zé Serra” (como é chamado o personagem na série correspondente ao pré-candidato tucano) era Ministro da Saúde do governo FHC. E o quarto, e último, volume – que deverá ser lançado até junho – discutirá o Plano Real.

Em todos os gibis, os personagens moram em um lugar chamado “Vila Brasil”, que bem poderia ser chamado de “Serrolândia”, já que boa parte das informações trazidas pelo gibi são falaciosas e só existem no mundo imaginário de Serra. O uso do número 45 – referente à legenda do PSDB – também é intenso e subliminar em todas as histórias. De acordo com a Folha, “o número da casa onde os personagens moram é 45. No quarto onde a mãe segura o bebê recém-nascido, um cartaz ao fundo traz os dizeres: ‘Dieta 45 dias’. Ainda no hospital, uma placa indica ‘salas 4-5’”.

Mas é importante destacar que nem tudo que foi feito na gestão do Zé Serra – seja como ministro do Planejamento e da Saúde, ou como Prefeito e depois governador de São Paulo – é apontado no gibi. Vejamos alguns dos vários pontos que foram, oportunamente, deixados de fora das histórias em quadrinhos criadas pelo demo-tucanato:

01. Saúde
O gibi tucano engana o leitor ao dizer que a implantação dos medicamentos genéricos foi "um marco do ministro Serra, considerado o melhor ministro da Saúde da história do país”. Isto porque o verdadeiro “pai” dos genéricos foi o ex-deputado federal pelo PSB Jamil Haddad. Ministro da Saúde do governo Itamar Franco entre outubro de 1992 e agosto de 1993, Haddad foi o responsável pelo decreto 793, de 5 de abril de 1993, que implantou oficialmente os genéricos no país, bem antes de Serra tomar para si a paternidade.

Além disso, o gibi tucano omite o tratamento que Zé Serra deu, enquanto governador do estado de São Paulo, à área da saúde: o leitor não é informado, por exemplo, de que mais de R$ 2,1 bilhões em repasses do SUS (Sistema Único de Saúde) foram utilizados em aplicações no mercado financeiro, deixando de ser investidos na compra de medicamentos para a população, em programas de controle de epidemias e também em programas como o Saúde da Família. A história em quadrinhos também não esclarece sobre a terceirização dos serviços de saúde no Estado de São Paulo, que já atinge 90% do pessoal na região do ABC Paulista, nem cita a epidemia de dengue que toma conta do Estado de São Paulo.

02. Educação
A “Vila Brasil” do Zé Serra não tem problemas na área de educação, sendo o verdadeiro paraíso. Muito diferente, portanto, da realidade que Serra deixou no estado de São Paulo, onde a qualidade do ensino na rede pública tem caído a olhos vistos. Prova disso é o resultado do Saresp, que mostrou que um aluno da rede pública sai do terceiro ano do ensino médio com o conhecimento equivalente a um aluno de 8ª série do ensino fundamental. Em matemática, por exemplo, a situação é mais alarmante.

Os professores são cada vez mais desvalorizados na gestão Serra: segundo a Apeoesp, o sindicato da categoria em São Paulo, a defasagem salarial ultrapassa os 34%. Zé Serra propagandeia o “bônus de rendimento” implantado no magistério paulista, mas esconde que os professores estão sem receber aumento real em seu salário há um bom tempo. O gibi tucano também não revela o fato de que, quando esses professores exercem o seu direito legítimo de greve, são tratados a paulada pela Polícia Militar do Zé Serra!

03. Criminalidade
O gibi tucano esconde também o aumento dos índices de criminalidade em todo o Estado de São Paulo. Para se ter uma idéia, somente nos primeiros meses de 2010, o número de homicídios cresceu 7% em todo o estado. A violência sexual contra a mulher e o tráfico de entorpecentes também tomam conta de São Paulo, se concentrando, sobretudo, no interior do Estado. Entre 2008 e 2009, o tráfico de drogas cresceu 12% no estado de São Paulo, de acordo com os números da Secretaria de Segurança Pública.

O interior responde pela esmagadora maioria dos casos registrados de tráfico de entorpecentes no estado em 2009: 66%! Enquanto isso, o governo de Zé Serra no Estado reduz investimentos previstos na lei orçamentária em setores estratégicos, como inteligência policial. Entre janeiro e outubro de 2009 foram investidos apenas R$ 135 milhões em inteligência policial, dos R$ 253 milhões orçados para o setor. O policiamento escolar, nesse mesmo período, recebeu apenas R$ 2,4 milhões de investimento do governo do Zé Serra.

04. Programas sociais
O primeiro gibi da série produzida pelo PSDB toma para o partido a paternidade do Bolsa Família, que foi implantado em 2003 no governo Lula. Além de transmitir uma informação totalmente falaciosa, já que o Bolsa Família é muito mais amplo que o Bolsa Escola de FHC, o gibi tucano ainda omite o fato de que o governo do Zé Serra em São Paulo não demonstrou o mínimo de comprometimento com a implantação e, muito menos, com a ampliação do Bolsa Família no Estado.

Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social, somente na cidade de São Paulo 300 mil famílias estariam aptas a receberem o benefício do Bolsa Família. Contudo, pelo fato de a Prefeitura e o governo do Estado não terem disponibilizado funcionários para o cadastro das famílias, apenas 170 mil recebem de fato o benefício. E outro dado importante: 65 mil famílias paulistanas deixaram de receber o Bolsa Família porque a gestão Serra/Kassab não fez o recadastramento exigido pelo programa.

05. Contratos suspeitos
O gibi tucano também omite os vários escândalos ocorridos durante a gestão Zé Serra em São Paulo. O mais conhecido desses escândalos – que teria começado na época do governo tucano de Mário Covas – é o caso Alstom, no qual políticos do PSDB paulista teriam recebido propina da empresa francesa para favorece-la nos contratos de expansão do metrô de São Paulo. Segundo as denúncias, a Alstom teria pago US$ 6,8 milhões em propina aos quadros do tucanato, em troca de contratos que lhe renderam US$ 45 milhões.

Outro escândalo do governo do Zé Serra em São Paulo – e que naturalmente não está no gibi tucano – refere-se a 51 contratos, no valor total de R$ 63 milhões, que a Secretaria Estadual de Saúde tem com a Hopsfar, uma empresa de medicamentos que está envolvida no caso do mensalão do DEM, em Brasília. De acordo com informações do Jornal da Tarde, somente no primeiro trimestre de 2010, o governo de São Paulo já empenhou R$ 5,5 milhões em favor dessa empresa.

06. Publicidade
Além disso, o gibi tucano não conta aos seus leitores que os gastos com publicidade do Zé Serra cresceram nada menos que 620% ao longo do seu governo no Estado de São Paulo. Segundo dados do Sistema de Gerenciamento do Orçamento do Estado (SIGEO), as despesas do governo paulista com propaganda saltaram de R$ 40,7 milhões em 2006, ano anterior à posse de Serra, para R$ 293 milhões em 2009. Deve-se destacar que todo esse crescimento foi feito mediante remanejamento de despesas do orçamento previsto para outras áreas, como saúde, educação e segurança.

Para se ter uma idéia do que representam esses números, basta dizer que um hospital com 250 leitos, construído e montado com toda a infra-estrutura, custa aos cofres públicos algo em torno de R$ 50 milhões. Com o que gastou em publicidade no ano passado, quando já pleiteava a candidatura à Presidência, Serra poderia ter construído seis hospitais no estado. Isso quer dizer que ao invés de construir 1500 novos leitos no estado, Zé Serra preferiu aplicar o dinheiro em publicidade oficial.

07. Apagão
Outro ponto interessante é que o gibi tucano aponta Zé Serra como um homem eficiente, sério: um modelo de gestor público. O que o gibi do PSDB não comenta, por pura conveniência, é que Zé Serra foi ministro do Planejamento de FHC entre 1995 e 1996, mas não conseguiu evitar que o Brasil enfrentasse o malfadado apagão em 2001. E porque houve esse racionamento de energia que durou oito meses? Por simples falta de planejamento do governo FHC, do qual Serra foi o responsável pela pasta de planejamento em seu início.

Percebe-se, dessa maneira, que o gibi tucano é uma obra meramente fictícia, tanto quanto os “feitos” do Zé Serra que ali constam. Produto da demagogia barata do demo-tucanato, as histórias em quadrinhos, se procuram por um lado tentar exaltar a figura do presidenciável José Serra, acabam na verdade tentando diminuir a inteligência do povo brasileiro, já que mostram situações que só ocorrem na “Serrolândia” e omitem tantas outras que ocorrem no mundo real.

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