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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Saúde pública e até aliados do PSDB criticam projeto tucano que privatiza SUS em SP

O debate em torno da reserva de leitos em hospitais públicos paulistas para pacientes atendidos por convênios médicos, proposto pelo governador de São Paulo, Alberto Goldman, através do PLC (Projeto de Lei Complementar) 45/10, não tem trazido consenso nem na própria base aliada do governo tucano. Deputados da bancada de oposição na Alesp (Assembléia Legislativa de São Paulo), liderados pelo PT, realizaram na terça-feira, 7, uma audiência pública com representantes da saúde pública de São Paulo, objetivando discutir as implicações dessa proposta absurda do governo tucano. Também participaram deputados de partidos aliados a Goldman.

Os representantes classistas do setor de saúde pública em São Paulo foram unânimes em rejeitar a proposta que permite às OSS (Organizações Sociais de Saúde), que administram os hospitais públicos no Estado, reservarem até 25% dos seus leitos para atendimento de usuários de planos de saúde. De acordo com o Presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo, Cid Carvalhaes, o que o projeto apresentado pelo governador do Estado propõe nada mais é do que a criação de uma fila dupla para o atendimento em hospitais públicos, “onde os ricos serão privilegiados”. Carvalhaes também acrescentou que caso o projeto seja aprovado, o Sindicato dos Médicos questionará na Justiça sua constitucionalidade.

Projeto fere princípio da equidade do SUS
A representante do Conselho de Secretários Municipais da Saúde do Estado de São Paulo, Maria do Carmo Cabral Carpinteiro, também avaliou que, ao reservar parte dos leitos destinados inicialmente a pacientes do SUS para usuários de convênios privados, o governo de São Paulo estaria criando “ilhas de excelência” nos serviços de saúde. De acordo com Maria do Carmo, esse tipo de prática fere frontalmente o princípio da equidade inerente ao SUS, além do fato de que as OSS não têm sido bem fiscalizadas pelo poder público. Esse foi outro ponto que mereceu destaque durante o debate: o vice-presidente do Conselho Regional de Medicina, Renato Azevedo Júnior, questionou se o pagamento pelo atendimento, previsto no PLC, iria para o Tesouro do Estado ou para as OSS.

Essa preocupação do representante do CRM, diga-se de passagem, é totalmente pertinente, haja vista que, diante da falta de fiscalização das OSS, não seria surpresa se esses recursos pagos pelos convênios médicos pelos atendimentos prestados em hospitais públicos não fossem parar no erário. Sem contar o fato de que este argumento defendido pelos tucanos para aprovação do projeto – o de gerar recursos para serem reaplicados na saúde pública – é totalmente questionável. Primeiro, porque já existe uma Lei Federal, de 1998, e outra Estadual, de 1994, que já prevêem que eventuais serviços prestados por hospitais públicos a convênios médicos devem ser ressarcidos por estes. Ou seja, não é necessário mais um PLC para colocar em funcionamento isto.

Sem contar, e é interessante que se diga aqui, que o deputado tucano Samuel Moreira, que foi à audiência pública para defender o projeto, foi traído por suas próprias palavras. De acordo com Moreira, esses pacientes de alto custo geram um lucro injustificado aos convênios médicos e sobrecarregam o SUS, portanto é justo cobrar por esse atendimento. Ora, se o próprio tucano concorda que esse tipo de prática já sobrecarrega o SUS, qual a lógica de se defender um projeto que retira leitos que são destinados a usuários do SUS para reservá-los para planos de saúde? Não há lógica nenhuma nesse pensamento! Se a justificativa forem as verbas obtidas pela cobrança dos serviços, que se cobrem então os serviços eventualmente prestados, sem instituir reserva de vagas!

Não há explicação racional e coerente para se aprovar esse projeto senão aquela alertada pelo Presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde Pública do Estado de São Paulo, Benedito Augusto de Oliveira: a privatização do SUS em São Paulo. Essa é a única explicação para esse projeto absurdo do governo tucano. E de tão absurdo que é, o projeto não encontra respaldo completo nem dentre os deputados que compõem a base aliada do governo paulista. O deputado Luiz Carlos Gondim, do PPS, declarou voto contrário ao PLC do governador Goldman. Nessa mesma linha, o deputado do PMDB quercista, aliado ao Palácio dos Bandeirantes, Uebe Rezeck, também questionou o conteúdo do projeto enviado pelo governador Goldman em caráter de urgência para a Alesp.

Deputado tucano também é contra o projeto
Até mesmo um deputado tucano, demonstrando consciência, se posicionou contra o PLC 45/10. De acordo com a Rede Brasil Atual, o deputado do PSDB, Pedro Tobias, concorda com as críticas da oposição e também avalia que os hospitais públicos não têm condições de oferecer uma parcela de seus leitos a usuários de planos de saúde. Segundo Tobias, “como médico cirurgião avalio que esse é um projeto polêmico que deveria ser específico para o Instituto do Câncer. Para outros hospitais, sou contra”. Na audiência pública realizada para debater o projeto, o deputado acenou com uma proposta de emenda ao PLC restringindo sua aplicação ao Instituto do Câncer, em São Paulo.

Essa talvez seja a atitude mais sensata no momento. Considerando que 1) a oposição não tem maioria na Alesp para barrar sozinha o PLC e que 2) é praticamente impossível mudar a quantidade de votos necessária na base aliada ao governo do Estado para rejeitar o projeto, a apresentação dessa emenda seria uma forma de evitar o “mal maior”, que seria justamente a reserva de vagas em toda a rede pública de São Paulo administrada pelas OSS. Como dito anteriormente, o melhor dos mundos nesse caso é que a Alesp derrube o projeto absurdo apresentado pelo governo tucano. Não conseguindo isso, que seja apresentada algum tipo de emenda, como a proposta por Pedro Tobias, para restringir ao máximo a aplicação dessa “reserva de leitos”.

Do lado de cá, não podemos assistir a tudo isso como meros espectadores. A bancada de oposição a esse projeto absurdo dos tucanos está fazendo um excelente trabalho na Alesp, discutindo e procurando formas de impedir a aprovação dessa proposta que nada mais é do que a privatização do SUS em São Paulo. Alguns jornalistas, como José Luiz Datena, da Band, também vêm denunciando a onda de terceirização nos serviços de saúde em São Paulo, criticando o baixo investimento em qualificação de pessoal e a hegemonia das OSS na rede de hospitais públicos do Estado. Mas, como era de esperar, a maior parte da grande imprensa está calada, fazendo de conta que não existe esse projeto. Cabe a nós, portanto, divulgar essa afronta dos tucanos à saúde pública e aos usuários do SUS em São Paulo!

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