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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Desoneração da folha de pagamento e sua relevância para o aumento do emprego formal

Uma das principais propostas da Presidenta Dilma Rousseff no período em que ainda disputava a Presidência da República, no ano passado, deve tomar forma de projeto nos próximos dias para ser enviado, então, à votação posterior no Congresso Nacional. De acordo com reportagem da Folha de São Paulo publicada nesta sexta-feira, 21, o governo prepara uma proposta de desoneração da folha de pagamento, que será o primeiro ponto de um projeto de reforma tributária que deverá ser apresentado em partes no Congresso.

O debate em torno da questão da desoneração da folha de pagamento do setor produtivo, mediante redução da alíquota de contribuição previdenciária das empresas, tem longa data no Brasil, tendo sido aprofundado especialmente a partir da segunda metade da década de 90, quando o país viu ser intensificado o movimento de redução do emprego formal no mercado de trabalho. Para se ter uma idéia, os trabalhadores com carteira assinada correspondiam a 53% do mercado de trabalho em 1992, número que foi se reduzindo gradativamente, até chegar a 45,3% em 2002, de acordo com dados da Pesquisa Mensal do Emprego, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Redução de encargos deve elevar emprego formal
Essa redução da formalidade tem íntima relação com o custo tributário para o empresário formalizar sua mão de obra. Atualmente, a alíquota de contribuição previdenciária para o setor produtivo é de 20% sobre a sua folha de pagamento, o que certamente é um patamar bastante elevado. Medidas tomadas ao longo do governo Lula, relacionadas à simplificação tributária para micro e pequenas empresas, através do Super-Simples, ajudaram a reverter essa tendência de queda do trabalho formal, de forma que atualmente o emprego formal corresponde a 52% do mercado de trabalho brasileiro, retomando, portanto, níveis compatíveis com aqueles verificados no início dos anos 90, antes de se fortalecer o processo de informalidade.

O objetivo do governo Dilma é ampliar ainda mais o nível de formalidade da economia brasileira, levando-o a 60% no final dos próximos 12 meses, segundo as informações da Folha. Para tanto, a Presidenta pretende propor ao Congresso uma redução escalonada da alíquota de contribuição previdenciária, fazendo um corte, já neste primeiro ano, de 2 pontos percentuais. Assim, o recolhimento por parte das empresas passaria de 20% para 18% sobre a sua folha de pagamento. Nos períodos posteriores, essa redução continuaria sendo feita de forma progressiva, até atingir o patamar de 14%. Vale destacar que esse nível mínimo ainda não é certo, pois muitos dentro do governo defendem um patamar ainda menor, de 10% ou 12%.

De qualquer forma, esse corte por si só é muito interessante à medida que ajuda a reduzir a curva marginal de custos das empresas, abrindo espaço no médio prazo para novas contratações com carteira assinada. É uma boa maneira, nesse sentido, de levar o empregador a formalizar aqueles trabalhadores que trabalham sem registro na carteira, recebendo “por fora”. Ou seja, ganham os empregadores e também os trabalhadores: os primeiros pela redução dos custos marginais e os segundos pelo crescimento do emprego formal. Embora as Centrais Sindicais sejam contrárias a essa redução, alegando a inexistência de uma contrapartida que minimize possíveis impactos no déficit da Previdência Social, a medida é muito boa.

Isto porque, como nos ensina a Teoria Econômica, a eficiência de um tributo (auferida pelo nível de arrecadação) cresce até um determinado nível de alíquota, denominada de “alíquota ótima”. A partir desse ponto, qualquer aumento marginal da alíquota do tributo faz cair a arrecadação, de forma que a curva passa a ter formado decrescente, como pode ser visualizado na figura abaixo. Esse modelo, largamente conhecido na Economia, é denominado “Curva de Laffer”. Ele nos mostra que atualmente parte da informalidade é explicada pela alta carga tributária, de forma que uma redução na alíquota da contribuição previdenciária de B para A pode aumentar o nível de arrecadação do governo e, com isso, a eficiência do tributo.


Intuitivamente isso é lógico: com um menor custo marginal da mão-de-obra, o empresário poderá expandir sua folha de pagamento. Como a alíquota de contribuição previdenciária será menor, ele poderá ampliar sua contratação formal até certo nível máximo, no qual ele estará pagando o mesmo montante anterior de tributo sobre a folha, mas com mais empregados contratados. Suponha, por exemplo, que uma firma tenha 10 funcionários contratados com carteira assinada e que cada um receba R$ 600. A folha de pagamento dessa empresa é de R$ 6.000 e, com uma alíquota de contribuição previdenciária de 20%, ela paga R$ 1.200 à Previdência Social. Se a alíquota cair para 14%, por exemplo, ela pagará R$ 840 por estes mesmos 10 funcionários.

Essa “economia” de R$ 360 pelo empresário é vista, pelas Centrais Sindicais, pelo lado de uma menor arrecadação da Previdência Social, o que pode ocasionar problemas para o sistema previdenciário no longo prazo, caso não seja feita uma Reforma. Contudo, esse alívio fiscal deve ser entendido como um incentivo para o setor produtivo contratar novos trabalhadores com carteira assinada ou formalizar os que trabalham na informalidade. Nesse mesmo exemplo, se a empresa contratar mais 3 trabalhadores formais, sua folha de pagamento passará para R$ 7.800, recolhendo R$ 1.170 em contribuição previdenciária (15% de R$ 7.800). Veja que embora a folha de pagamento tenha ficado maior, a contribuição previdenciária é praticamente a mesma que pagava antes, só que com mais funcionários e uma produção maior.

A discussão acadêmica
É interessante destacar que alguns estudos acadêmicos contestam a hipótese de aumento da formalidade através da redução da alíquota de contribuição previdenciária. Um estudo feito em 2003 por Bordonaro a partir de dados em painel de 9 países latino-americanos em relação ao período entre 1980 e 2000 revelou que o impacto da variação do PIB per capita sobre a informalidade é maior que o impacto da alíquota previdenciária. Segundo este estudo, para cada 1 ponto percentual de aumento da alíquota previdenciária, o impacto sobre a informalidade é de +0,3 ponto percentual, ao passo que para cada 1 ponto percentual de acréscimo do PIB per capita, o impacto sobre a informalidade é de -1,7 ponto percentual, maior em módulo.

Estudos feitos por economistas brasileiros nesse mesmo período confirmam a conclusão de Bordonaro: a variação dos encargos sobre a folha de pagamento teria, segundo estes estudos, pouco impacto sobre o emprego formal, afetando antes os salários dos ocupados formais. Ou seja, esses estudos mostram que reduções da alíquota previdenciária ao invés de aumentar o emprego formal, aumentavam o salário médio dos trabalhadores do mercado formal. Essas conclusões, embora sejam bastante interessantes e pertinentes, devem ser vistas com ressalva hoje em dia. Isto porque tivemos, ao longo desses últimos oito anos, mudanças estruturais importantes no mercado de trabalho brasileiro.

A principal delas diz respeito à própria estabilidade do mercado de trabalho nos dias de hoje, que aumenta a racionalidade dos trabalhadores na análise do custo/benefício em sair da informalidade e ir para a formalidade. No final da década de 90, período ao qual se referem os dados dos estudos mencionados acima, a instabilidade do mercado de trabalho fazia com que grande parte dos trabalhadores aceitasse continuar na informalidade, sob o temor de perderem o seu emprego. Hoje em dia, no entanto, existe um ambiente mais seguro no mercado de trabalho (não em termos institucionais, pois isso já existia, mas sim em termos de estabilidade econômica), o que leva o trabalhador a considerar, sobretudo, o diferencial positivo de benefícios no mercado formal.

Portanto, embora admitamos que uma parcela da “economia” feita pelo empregador com a redução da alíquota de contribuição previdenciária possa de fato ser transformada em aumento salarial para os trabalhadores que já estão empregados, não podemos desconsiderar que grande parte da redução de custo deverá servir como incentivo para aumento da formalidade. Tendo isso em vista, o governo Dilma toma uma iniciativa muito importante e boa para a economia brasileira ao pensar um modelo de redução da alíquota previdenciária sobre a folha de pagamento com o objetivo de ampliar o emprego formal. A Presidenta está, sem dúvida, no caminho correto!

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