Cardápio do boteko

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Especulação imobiliária travestida de discurso ambiental ameaça moradores do Horto, no Rio

Desde meados dos anos 80, moradores da região do Horto Florestal, no Rio de Janeiro, começaram a sofrer com processos judiciais de reintegração de posse movidos pelo Jardim Botânico. A valorização dos imóveis na região do Jardim Botânico ao longo dos anos fez com que, nesses últimos meses, o conflito fundiário entre o Jardim Botânico e as centenas de famílias que vivem no Horto se intensificasse ao ponto de jornais como O Globo e parte da classe média carioca iniciarem uma verdadeira “cruzada” contra os moradores do Horto, taxando-os de “invasores”.

A realidade, contudo, é muito diferente daquela veiculada nas páginas do Globo ou ecoada por setores da classe média interessados na especulação imobiliária. A região do Horto passou a ser ocupada após a década de 50, quando a direção do próprio Jardim Botânico ofereceu aos vigias do parque moradias ali naquele entorno. A idéia era que as fronteiras do Jardim Botânico fossem permanentemente vigiadas, afastando o risco de crimes naquelas áreas. Aos poucos, a direção do Jardim Botânico estendeu aos outros funcionários do parque essa possibilidade de morar mais próximo ao seu local de trabalho, como bem descreve a historiadora e coordenadora do Museu do Horto, Laura Olivieri Carneiro de Souza:

No final da década de 1950 o diretor Paulo Campos Porto convidou os funcionários do Parque e do Horto que residiam em sua maioria na região do Grotão, mas também nas Vilas operárias perpendiculares à Rua Pacheco Leão e em outras localidades, para construírem suas casas mais perto do trabalho. A própria administração do Jardim Botânico desenhou uma planta de assentamento de casas a serem doadas para aqueles trabalhadores, as quais foram levantadas com o suor de seus corpos e captação de materiais a partir de seu próprio sacrifício. O Jardim entrava apenas com a planta. Assim nasceu o Caxinguelê, essa localidade que faz limite com o Parque e que vem sendo estigmatizada socialmente como ‘invasora’ da cidade. Com a construção das casas, Juscelino Kubitschek fundou a Escola Municipal e os moradores fizeram o seu clube de esporte e lazer”.

Especulação imobiliária contra moradores do Horto
Essa descrição feita pela historiadora e fruto de um longo trabalho de pesquisa sobre a ocupação da região desmonta por completo a falácia difundida pelo Globo e por alguns setores da classe média de que os moradores do Horto seriam “invasores”. Ora, se o próprio Jardim Botânico lhes ofereceu a possibilidade de morar naquela região, então não há invasão alguma. O que acontece é que a partir dos anos 80, como dito anteriormente, a região passou a ser cada vez mais alvo da especulação imobiliária, esta sim o verdadeiro fator da cruzada contra os moradores do Horto. E é interessante destacar ainda que não são somente essas famílias de funcionários e ex-funcionários do Jardim Botânico que habitam aquela região: atualmente, o Horto é ocupado por várias fundações e também condomínios de classe média alta.

E agora o mais interessante: nem as fundações nem os condomínios luxuosos são alvos de quaisquer processos de reintegração de posse. Isso deixa muito claro o caráter elitista do discurso de quem defende a desapropriação dessas quase 600 famílias de classe baixa que vivem ali na região do Horto. Esse elitismo fica muito evidente em um artigo do jornalista Marcos Sá Correa, publicado em novembro pelo Globo. Beirando a boçalidade, Correa usa um discurso supostamente ambiental para esconder o que de fato existe por trás dessa luta contra os moradores do Horto. A própria ironia do título do artigo – “Que belo Horto para plantar favela” – já antecipa o tom elitista que o autor desfia nas linhas que o sucedem.

Aquilo se chama Horto porque abrigou até meados do século passado talhões de mudas para reflorestamento. Eles constam de mapas do Ministério da Agricultura até meados da década de 1940. Suas alamedas tinham nomes de árvores. Era, então, um Horto ao pé da letra. A cidade perdeu-o. Ele foi surrupiado por administrações pródigas e funcionários espertos, depois por descendentes e colaterais de funcionários espertos, enfim por amigos e locatários de funcionários espertos. Qualquer um aproveitou a bagunça para se aboletar no jardim. O Jardim Botânico sequer fez a conta das casas que semeava. Seu número ainda varia entre 550 e 621. Há entre elas residências funcionais que ainda guardam os traços da arquitetura oficial. E também biroscas, garagens, oficinas e puxadinhos para acomodar famílias que procriam, parentes que chegam de longe e carros que não param de se multiplicar”.

Impressiona o tom de segregação e preconceito assumido nas palavras do jornalista do Globo ao tratar os moradores do Horto, que legitimamente ali se estabeleceram, como “invasores espertos”. O argumento de que a ocupação, especialmente na comunidade do Caxinguelê, ameaça as áreas verdes do Jardim Botânico e da própria Floresta da Tijuca cai por terra quando o próprio secretário executivo do Parque Nacional da Tijuca, Roberto Maggessi, sai em defesa dos moradores. Em carta enviada à Associação dos Moradores e Amigos do Horto, Maggessi explica que a comunidade do Horto jamais foi ameaça ao Parque, já que nem se situa em seus limites, mas sim na Zona de amortecimento, assim chamada por delimitar um espaço intermediário entre a cidade e a Floresta.

Visão progressista da SPU não agrada O Globo
E o mais interessante é que na lista de bobagens escrita pelo Globo, sobra até mesmo para a Secretaria de Patrimônio da União, que está intermediando o processo de regularização fundiária da região. O Globo não se conforma, na realidade, da mudança na orientação da SPU a partir de 2003, quando deixou de ser um mero órgão que catalogava propriedades da União para adotar uma postura sócio-ambiental na gestão do patrimônio da União. No mesmo artigo citado anteriormente, o jornalista Marcos Sá Correa atribui à SPU os atributos “militante e omissa”. Ora, o que o jornalista defensor da especulação imobiliária não percebe que é a SPU era omissa anteriormente; hoje em dia, ela adota uma postura totalmente progressista e em sintonia com o processo de democratização das instituições brasileiras. Assim diz Laura Olivieri Carneiro de Souza:

A mediação desse conflito de interesses no Horto pela SPU está sendo conduzida com ideário progressista e atesta o processo de democratização das instituições que nosso país está vivenciando merecidamente. Isso incomoda uns poucos 'poderosos' que têm visto os seus planos ruírem ou serem ameaçados por uma comunidade pobre no pulmão da zona sul carioca, num cenário deslumbrante exatamente por ser o Horto Florestal e nada diferente desta identidade e desta territorialidade (Fonseca, 2008).

Gostariamos de chamar a atenção para o duplo absurdo que está sendo vendido aos leitores desse meio de comunicação: primeiramente a tentativa de inverter a historicidade da região, 'plantando uma favela' (para usar a própria metáfora utilizada no perverso artigo publicado no jornal O Globo do dia 19/11/10) à revelia da realidade socio-histórica de uma comunidade tradicional, tranquila, honesta e trabalhadora cuja memória social refere-se ao trabalho e remonta ao Brasil colonial, compondo-se do entrecruzamento de personagens e momentos relevantes da história nacional, como a instalação da alta nobreza setecentista no Solar da Imperatriz, a resistência quilombola, as históricas lutas de classe do período da industrialização nacional, a resistência comunista durante as ditaduras militares, etc.

O direito à moradia dos habitantes tradicionais do Horto está ancorado em ampla e diversa legislação, nacional e internacional, que lhes garante a permanência e a posse da terra. Esses direitos estão igualmente fundamentados na legitimidade que esses moradores possuem com relação à região que ocupam historicamente. Crime é tentar retirá-los de onde estão, visando loteamentos milionários que a especulação imobiliária cobiça construir. Isso sim ameaçaria todo o meio-ambiente em sua dialética dimensão socio-ambiental
”.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Entenda o que há de estranho por trás do absurdo aumento da tarifa de ônibus em SP

O presente do Prefeito Gilberto Kassab (DEM) para a população paulistana neste final de ano veio na forma de um absurdo aumento da passagem de ônibus a partir do próximo dia 5 de janeiro. Nesta data, os usuários de ônibus da capital paulista terão que desembolsar R$ 3,00 para a passagem, o que corresponde a um aumento de 11% frente à tarifa atual, que é de R$ 2,70. Esse reajuste corresponde a uma elevação real de mais de 5%, uma vez que a inflação registrada em São Paulo em todo o ano de 2010 ficou em 5,84%, de acordo com o IPC (Índice de Preços ao Consumidor) da Fipe.

O último reajuste, ocorrido em janeiro desse ano, quando a passagem subiu de R$ 2,30 para R$ 2,70, era até justificável, já que a tarifa do ônibus urbano havia ficado inalterada nos três anos anteriores. A elevação anunciada nesta terça-feira, 28, ao contrário, é totalmente descabida, uma vez que, além de ocorrer numa proporção equivalente a quase o dobro da inflação verificada na região metropolitana de São Paulo, causa estranheza em função do aumento colossal dos subsídios previstos para 2011. Isso é totalmente desconexo, uma vez que se os subsídios crescem, o natural seria que a tarifa não registrasse aumento ou crescesse em proporção menor.

Subsídios da Prefeitura atingiram R$ 600 milhões este ano
Para quem não sabe, todos os meses a Prefeitura, por meio da SPTrans, transfere uma quantidade de recursos (subsídios) para as empresas de ônibus que operam o transporte na capital. Esses valores são destinados a cobrir as gratuidades do transporte coletivo, como aquelas oferecidas aos idosos e a meia-passagem para estudantes. Assim, uma parte das despesas da SPTrans é coberta com recursos obtidos na catraca, com a venda de bilhetes, e a outra parte vem na forma de repasses da Prefeitura previstos no orçamento. Somente neste ano, a Prefeitura repassou R$ 600 milhões em subsídios para as empresas de ônibus, o que representa 13% dos custos totais do sistema de transporte da capital.

Esse volume de subsídios estourou em muito a previsão orçamentária para este ano, que destinava, em sua versão original, apenas R$ 360 milhões em repasses para as empresas de ônibus. Contudo, esse volume foi estourado já em julho, quando os subsídios da Prefeitura fecharam aquele mês em quase R$ 383 milhões. A partir de então, o prefeito Kassab começou a remanejar recursos de outros projetos (como a construção de novos corredores e terminais de ônibus) para cobrir as necessidades de transferências para as empresas de transporte coletivo. A Secretaria de Transportes alega que esses recursos “extras” seriam utilizados não somente na compensação da gratuidade mas também na renovação da frota de ônibus.

É preciso dizer aqui que isso é muito difícil de confirmar, uma vez que desde o ano passado a Prefeitura deixou de diferenciar o que representa transferências a titulo de renovação da frota e o que se refere a compensações de gratuidades. Desde então, todas as transferências da Prefeitura para as empresas de ônibus são feitas sob a rubrica “compensação tarifária”. Além disso, qualquer pessoa que ande de ônibus na capital paulista não consegue ver de fato essa “renovação da frota” apontada pela Secretaria de Transportes para explicar os subsídios extras repassados às empresas de transporte coletivo. Vale dizer, inclusive, que os próprios dados da SPTrans não indicam um aumento da frota nos últimos anos.

Tarifa cresce mesmo com aumento dos subsídios
Para 2011, o prefeito Kassab destinou inicialmente R$ 600 milhões na peça orçamentária enviada à Câmara Municipal para serem gastos em subsídios, o que corresponde ao mesmo valor executado esse ano (vale lembrar, contudo, que na comparação com o Orçamento aprovado para 2010, esse valor é 67% superior). Como os subsídios repassados pela Prefeitura não deveriam ter aumento (se comparados à execução orçamentária deste ano), a Secretaria de Transportes admitia um aumento no valor da passagem para R$ 2,90. Ou seja, a expectativa era que a passagem subisse 7,4% frente a uma inflação projetada para o ano de 5,5%, representando, assim, uma elevação real de 1,9%.

Contudo, diversas emendas aprovadas na Câmara dos Vereadores elevaram os recursos direcionados a subsídios para R$ 743 milhões em 2011, o que corresponde a um valor 24% maior do que aquele repassado esse ano às empresas de transporte coletivo. E aí está a grande estranheza: mesmo com os subsídios orçamentários sendo aumentados em uma proporção descomunal de 24%, a Prefeitura anunciou um reajuste no valor da passagem de ônibus ainda maior do que o previsto inicialmente, chegando aos R$ 3,00. Ora, se os subsídios cresceram nessa magnitude, o mais razoável seria manter a tarifa ou, ao menos, elevá-la numa proporção inferior à casa dos R$ 2,90 e não aumentá-la para 3,00!

Esse aumento, segundo argumentação da Prefeitura, decorre de um estudo feito pela Secretaria de Planejamento Econômico, Orçamento e Gestão a partir de planilhas elaboradas pelas empresas de ônibus. Nessas planilhas, as empresas projetam seus custos para o próximo ano e a partir daí é definida a parte que será coberta pela Prefeitura (subsídios) e de quanto será o reajuste tarifário. Como é plausível pensar que a estrutura de custos das empresas, sob condições normais, não tenha aumentos explosivos, se os subsídios crescem, a tarifa pode ser “segurada”. Agora, esse aumento de 11% na tarifa não obstante a um crescimento de 24% dos subsídios soa muito estranho.

Para justificar essa situação, ou as empresas de ônibus estão projetando uma redução muito grande no número de passageiros transportados (o que é impensável) ou elas projetam um crescimento muito grande das despesas correntes e de capital no próximo ano. A não ser que as empresas de ônibus estejam planejando aumentos significativos nos salários de seus funcionários ou ainda planejando uma renovação em proporções colossais de suas frotas, não tem justificativa o fato de a passagem ser reajustada em 11% quando os subsídios da Prefeitura cresceram 24% para o período! Ficaria mais fácil entender isso se a Prefeitura disponibilizasse para consulta pública o tal estudo da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão junto com as planilhas das empresas de ônibus. Mas como transparência não é o forte dessa gestão, parece que pedir a divulgação desses dados é um pouco demais.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Garoto-símbolo da reeleição de Lula diz que sua vida mudou para melhor nos últimos anos

A Folha de São Paulo publicou nesta segunda-feira, 27, uma matéria muito interessante com um menino de apenas 11 anos que ficou muito conhecido há quatro anos, quando, sabendo da visita do Presidente Lula à sua cidade, correu para vê-lo e, vencendo toda a multidão, foi erguido pelo seu vizinho e conseguiu tocar em Lula. A imagem, captada pelo fotógrafo oficial da Presidência, tornou-se o grande símbolo da campanha de reeleição de Lula em 2006.

Everton é morador de uma cidade próxima a Salvador, na Bahia. De família bem pobre, o garoto revelou à Folha nessa reportagem que a vida de sua família “melhorou para melhor” durante o governo Lula: sua mãe conseguiu trabalho e, com a ajuda da renda extra do Bolsa Família, conseguiu comprar TV a cores, geladeira e outros eletrodomésticos. O melhor de tudo é saber que essa melhora das condições de vida não ocorreu apenas na família de Everton: ela é compartilhada por milhões de brasileiros.

“Nunca antes na história desse país” tivemos uma mobilidade social tão ampla, que foi garantida não apenas pelos programas de transferência de renda do governo Lula, mas principalmente pela geração de milhões de empregos e pelo bom desempenho da economia. É por isso que o pequeno Everton resume o sentimento de milhões de brasileiros ao dizer que “vai ficar com saudades do Presidente”. Para a sorte de Everton e de todos nós brasileiros o legado de Lula ficará em boas mãos: Dilma fará o país avançar ainda mais, aprofundando as políticas iniciadas por Lula. Abaixo, a íntegra da reportagem de Matheus Magenta, da Folha:

“Vou ficar com saudade do Presidente”
De castigo por causa de nota baixa na escola, o garoto Everton Conceição Santos, hoje com 11 anos, diz que não pensou duas vezes para fugir de casa pela janela e ver o presidente Lula inaugurar casas populares em Lauro de Freitas (região metropolitana de Salvador), em 2006. Diante da multidão no local, driblou os adultos passando por entre pernas e "saias de mulher", até que um vizinho decidiu erguê-lo sobre o ombro.

"Foi quando dei de cara com o Lula e consegui pegar na barba dele." O momento foi registrado pelo fotógrafo oficial da Presidência, e o garoto se tornou símbolo da campanha de reeleição de Lula. Desde então, Everton é conhecido como Lulinha. Nos quatro anos seguintes, ele diz que a vida da família "mudou pra melhor". Com o emprego que a mãe Odevânia conseguiu em 2007 (recebe um salário mínimo) e R$ 130 do Bolsa Família, ascenderam à classe D.

Entre 2002 e 2010, a massa de renda desses consumidores (com ganho familiar entre um e três salários mínimos) cresceu 161% - de R$ 146 bilhões para R$ 381 bilhões. Com a nova renda, a família de Everton conseguiu comprar TV de 21 polegadas, videogame, DVD, geladeira e trocar o fogão.

Chá e pão duro
"Antes, a gente só tomava chá e pão puro. Comida, só na casa da minha vó ou de vizinhos. Agora, tem pão, queijo, suco, tudo que dá vontade de comer", conta o garoto. Everton e três irmãos dormem em duas camas de solteiro no único quarto da casa -a mãe dorme no sofá da sala, onde está pendurada a foto do garoto com o presidente, autografada por Lula.

O salário de ajudante de cozinha permite agora que ela junte dinheiro para construir mais um cômodo na casa popular de 30 m2 que ganhou do governo. Em 2007, em reunião com ministros, Lula chamou de "vergonha" o projeto das casas entregues - um dos embriões do Minha Casa, Minha Vida-, por ser tão pequeno. Apesar do crescimento da renda, a família ainda enfrenta dificuldades como a falta de professores e filas em hospitais e postos de saúde.

"Quando a gente encontra médico, demora horas pra ser atendido. Não melhorou nem piorou nos últimos anos", diz Odevânia. Sua família está entre os 160 milhões que dependem exclusivamente do sistema público de saúde, área apontada desde 2007 no Datafolha como a pior do governo Lula.

Everton ri ao falar sobre a posse de Lula em 2007, onde esteve como convidado oficial, mas fecha logo a expressão ao falar sobre o fim do mandato dele. Diz não conhecer "direito" a presidente eleita, Dilma Rousseff, em quem sua mãe votou. "Sei só que ela é do partido do Lula. Mas ele vai voltar depois pra ser presidente. Vou ficar com saudades dele", diz, rindo novamente.

Tucanos tapam os olhos para impactos urbanos e ambientais do Trecho Norte do Rodoanel

A “menina dos olhos” do governo tucano em São Paulo – citada como “a maior obra viária do país” nos comerciais do governo do Estado – continua sendo alvo de muitas polêmicas. Após as denúncias de superfaturamento na execução do Trecho Sul e a constatação de que, após sua inauguração, o trânsito em São Paulo foi muito pouco reduzido, agora é o projeto do Trecho Norte do Rodoanel que vem despertando grandes críticas por parte de ambientalistas e também da população da Zona Norte de São Paulo e de Guarulhos. Os moradores dessas áreas, que serão os mais afetados pela obra do governo do Estado de São Paulo, discutem se de fato os supostos benefícios do Trecho Norte compensam os impactos ambientais e sociais do mesmo.

O Trecho Norte do Rodoanel deverá ter 44 quilômetros e ligará as rodovias Presidente Dutra e Ayrton Senna às rodovias Anhanguera, Bandeirantes, Castelo Branco, Raposo Tavares e Regis Bittencourt. De acordo com informações do Dersa, o custo da obra deve ser de R$ 5 bilhões, dos quais R$ 3 bilhões serão recursos do próprio Estado de São Paulo e o restante vindo de financiamentos. A grande discussão em torno do projeto se dá em relação ao impacto ambiental do mesmo, já que o traçado do Rodoanel deve passar pela Serra da Cantareira, ampliando os riscos de uma devastação ainda maior de uma das poucas áreas ainda existentes de reserva da Mata Atlântica.

Impactos ambientais e urbanos do Trecho Norte
No dia 16 de dezembro, o Dersa realizou, no auditório da Universidade de Guarulhos, uma audiência pública com moradores da região e ambientalistas, na qual compareceram também autoridades, dentre as quais o próprio prefeito de Guarulhos, Sebastião Almeida (PT). Os ânimos estavam tão exaltados que a audiência teve que ser cancelada após pessoas favoráveis à obra literalmente “saírem no tapa” com moradores contrários ao projeto. De acordo com uma denúncia do blog do jornalista Eduardo Reina, algumas pessoas favoráveis teriam sido pagas para comparecerem àquela audiência. Em uma postagem daquele mesmo dia, o jornalista escreve:

Entre os favoráveis estava um grande grupo de pessoas que foi pago para acompanhar a audiência e mostrar cartazes com dizeres pró-Rodoanel. Esses cartazes eram todos escritos com a mesma letra. Essas pessoas, muitas vindas de
ônibus da cidade de São Bernardo do Campo, receberam R$ 50 cada uma para ir à reunião. ‘Me deram R$ 50 para vir aqui e eu quero R$ 1 mil agora para não falar que fui pago’, disse um jovem que disse se chamar Ceará. Outra rapaz do mesmo
grupo, de nome Luiz, falou que eles vieram de São Bernardo, mas não revelou quem teria pago a gratificação para todos
”.

Nas últimas semanas, os moradores das regiões atingidas pelo projeto do Trecho Norte do Rodoanel intensificaram os protestos. Uma das questões levantadas por eles diz respeito ao EIA (Estudo de Impacto Ambiental) e ao RIMA (Relatório de Impacto no Meio Ambiente) apresentados pelo governo do Estado. Segundo os moradores, esses estudos não correspondem à realidade, uma vez que minimizam o risco potencial do empreendimento na área. Além disso, outro ponto de preocupação para os moradores é a desvalorização que as obras do Rodoanel provocarão em seus imóveis. Para se ter uma idéia, em alguns trechos do traçado, as pistas do Rodoanel Norte passarão a apenas 11 quilômetros do centro de São Paulo, muito próximas, portanto, do perímetro urbano.

O próprio estudo de impacto ambiental revela que as obras e, posteriormente, as pistas do Trecho Norte acarretarão “processos de desvalorização imobiliária pela redução das possibilidades de acesso futuro em áreas de expansão urbana situadas ao norte do traçado, acarretada pela ruptura da malha urbana”. A estimativa, segundo os moradores afetados, é de que seus imóveis possam ter desvalorização de até 50%. Além disso, existe uma preocupação muito grande dos ambientalistas em relação aos mananciais que existem naquela região e que são responsáveis pelo abastecimento de água de inúmeros bairros de São Paulo e também de Guarulhos. O traçado da obra deve interceptar os troncos de abastecimento que saem da ETA (Estação de Tratamento de Água) Guaraú, no bairro da Pedra Branca.

Desvio pela Dom Pedro reduziria custos e impactos
Um aspecto em particular chama bastante atenção em relação ao Trecho Norte: o próprio governo do Estado já assumiu que a demanda de tráfego nessa região é menor do que a registrada em outros trechos do Rodoanel, como o Trecho Sul, por exemplo. Ora, se a demanda de tráfego é menor, não faz nenhum sentido um investimento da ordem de R$ 5 bilhões nessa obra, além dos grandes impactos na região. De acordo com os ambientalistas, o traçado Norte do Rodoanel poderá destruir nada menos que 100 hectares da Serra da Cantareira, além da desapropriação de quase 3 mil imóveis e fechamento de dezenas de ruas. E como promover, então, a interligação da Dutra/Ayrton Senna com as demais rodovias para aliviar o trânsito na Marginal Tietê e não causar danos na região da Cantareira?

A resposta está a 50 quilômetros ao norte do traçado projetado para essa alça do Rodoanel – a rodovia Dom Pedro I, que faz a ligação entre a Dutra e Campinas. De acordo com vários estudos de engenharia de tráfego, a Dom Pedro é sub-utilizada para a infra-estrutura que possui, além de já absorver uma parte do fluxo que vem de Minas Gerais pela Fernão Dias e se dirige à rodovia dos Bandeirantes. Ou seja, ao invés de gastar R$ 5 bilhões em um projeto muito polêmico com o Trecho Norte do Rodoanel, o governo do Estado poderia aproveitar a estrutura já existente na Dom Pedro e fazer apenas um prolongamento até o Trecho Oeste do Rodoanel. De acordo com alguns estudos, isso custaria apenas R$ 1 bilhão, ou seja, 20% do custo inicial do Trecho Norte.

Além de custar bem menos, essa alternativa pela rodovia Dom Pedro não ocasionaria os impactos ambientais e urbanos acarretados pela alça norte do Rodoanel. Seria apenas uma questão de bom senso do governo do Estado em aproveitar uma estrutura rodoviária já existente e que é sub-utilizada. No próximo dia 19 de janeiro, uma nova audiência pública está marcada para discutir e avaliar os impactos do projeto. É importante que o governo Alckmin não faça como seu antecessor José Serra (PSDB), que na ânsia por entregar uma obra para ser vitrine eleitoral, acabou “atropelando” várias etapas, como a própria discussão do projeto com a população das áreas atingidas pelo Trecho Sul, encarecendo bastante, assim, o projeto. Não são poucos os impactos do Trecho Norte, o que já é razão suficiente para que o governo do Estado dê todo ouvido à população atingida.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Em nome das Olimpíadas, Prefeitura do Rio faz remoção truculenta de comunidades pobres

São inegáveis os ganhos tanto do ponto de vista da economia quanto da remodelagem do espaço urbano advindos da realização das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro. Sem dúvida, ao lado da Copa do Mundo de 2014, as Olimpíadas provocarão um grande aquecimento na economia carioca, em função da geração de milhares de empregos diretos e indiretos, aumento do fluxo de turistas para o Rio, crescimento das vendas do comércio e expansão do setor de construção civil. Além disso, o plano de mobilidade urbana feito para suprir a demanda tanto da Copa quanto dos jogos olímpicos deve criar uma estrutura de transportes que beneficiará muito a população do terceiro maior estado brasileiro.

Não obstante a todos esses benefícios, é impossível deixar de tratarmos de uma questão que tem se constituído em um verdadeiro problema para moradores da Zona Oeste do Rio, região que abrigará a maior parte da estrutura dos jogos olímpicos de 2016. De acordo com denúncias de moradores de comunidades da região, como a Vila Recreio II, a Vila Harmonia, a Restinga, a Vila Autódromo, dentre algumas outras, a Prefeitura do Rio tem promovido, desde meados de dezembro, remoções da forma mais arbitrária possível da população que mora nessas áreas. Segundo esses moradores, retroescavadeiras têm promovido um verdadeiro show de horrores, derrubando casas com pertences dos moradores dentro enquanto estes saem para trabalhar.

Remoção brutal dos moradores pela Prefeitura
Esse quadro é muito grave, pois a realização dos jogos, que deveria ser um bom motivo para melhorar as condições de vida desses moradores através da melhoria dos serviços prestados pelo poder público, vem sendo motivo para que a Prefeitura, ao contrário, aja da forma mais truculenta possível e desrespeite frontalmente o direito de moradia de milhares de pessoas. Em novembro, a Secretaria de Movimentos Populares do PT-RJ e as setoriais de moradia e reforma urbana do PT publicaram uma nota de repúdio a esse tipo de ação por parte da Prefeitura do Rio. Nesta semana, a urbanista e relatoria especial da ONU (Organização das Nações Unidas) para o direito à moradia adequada, Raquel Rolnik, descreveu da seguinte maneira as barbaridades que têm sido promovidas pela Prefeitura na Zona Oeste do Rio:

Sem qualquer negociação ou abertura ao diálogo, equipes da subprefeitura da Barra da Tijuca incluindo 40 homens da Guarda Municipal começaram uma operação de remoções sumárias e demolições de lares e pontos comerciais na área para a construção do Transoeste: um corredor de ônibus padrão BRT que fará a ligação da Zona Sul à Barra, região que concentrará a maioria das instalações e modalidades olímpicas em 2016.

Segundo denúncias, retro escavadeiras da empreiteira que constrói o corredor estariam derrubando casas com mobílias e pertences dentro. Durante o dia 15, alguns moradores alegam que tiveram suas casas derrubadas enquanto estavam fora trabalhando e outros que receberam um prazo até meia noite daquele dia para se retirarem e darem espaço às máquinas.

Uma equipe do Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro conseguiu, em caráter emergencial, uma liminar que suspendia as remoções forçadas, pois os oficiais da subprefeitura agiam sem ordem judicial de despejo ou intimação. Entretanto o pesadelo para os moradores dessas três comunidades da zona oeste carioca não terminou, já que a liminar da justiça não era válida a todos os imóveis
”.

A ocorrência desse tipo de prática nessa altura do ano não é de surpreender. Como bem se sabe, o mês de dezembro é marcado por uma maior dispersão e desmobilização dos movimentos sociais e até mesmo dos partidos políticos, em função das festas de final de ano. Essa “tradição” tem sido aproveitada pela Prefeitura do Rio para promover essas remoções “na calada do dia”, enquanto os moradores trabalham, sem encontrar qualquer tipo de resistência ou manifestação dos movimentos de moradia e de direitos humanos. Isso só torna a postura da Prefeitura ainda mais grave, pois além de promover remoções sem o menor diálogo com a população atingida, ainda o faz em um momento que essas pessoas estão desmobilizadas.

Prefeitura do Rio tem que mudar de atitude
É claro que as obras para as Olimpíadas são mais que necessárias. Isso todos concordam. O que não pode acontecer é que essas obras sirvam de pretexto para o poder público remover dessas regiões famílias que ali estão estabelecidas há décadas, que têm uma história com aquela região. Pior ainda é a forma com que têm sido feitas essas remoções. Se remover essas famílias já nos parece um tanto equivocado, quanto mais remover usando de brutalidade, promovendo uma verdadeira barbárie contra o direito fundamental de moradia e fazendo tudo isso à revelia da lei. Sim, porque de acordo com as denúncias dos moradores, a Subprefeitura da Barra da Tijuca e a empreiteira responsável pela obra não têm mandados judiciais para realizar essas desocupações.

E é impossível vermos toda essa arbitrariedade e truculência da Prefeitura em relação a essas comunidades sem levantarmos a questão relacionada às condições sócio-econômicas. Será que a Prefeitura do Rio agiria dessa mesma maneira se no traçado de suas obras estivesse um condomínio de luxo? Com certeza, não. Até mesmo porque, nesse caso, tudo seria acompanhado muito de perto pela imprensa e o fato seria amplamente explorado. Contudo, como se tratam de trabalhadores, pessoas pobres, a Prefeitura passa por cima da legalidade, não estabelece diálogo com essas comunidades e fere o direito de moradia de milhares de cidadãos. Tudo isso sem que a Rede Globo, que fica ali ao lado, em Jacarepaguá, se digne a destinar um mísero minuto em seus telejornais para denunciar essa grave situação.

É inadmissível que o Prefeito Eduardo Paes (PMDB) dê continuidade a esse show de horrores que tem sido promovido nas comunidades da Zona Oeste do Rio. Sem dúvida alguma, essa população é a mais interessada na realização dos jogos olímpicos, pois estes são uma oportunidade real de melhoria das condições de vida dessas pessoas. O que não se pode é transformar algo que seria para beneficiar o cidadão em um fato que fere os seus direitos e a sua dignidade. E é preciso também que o Secretário de Habitação do Rio, Jorge Bittar (PT), trabalhe com todas suas forças para evitar esse tipo de truculência do poder público para com os moradores dessas comunidades. Afinal de contas, a justiça social é o ponto central que tem pautado toda intervenção do Partido dos Trabalhadores na sociedade brasileira nesses 30 anos de existência.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Estadão municipaliza surto recorde de dengue em SP para isentar de culpa governo tucano

O esforço do Estadão para tentar dissociar o surto recorde de dengue em São Paulo neste ano da irresponsabilidade do governo tucano beira o ridículo. Em editorial publicado neste sábado, 25, o jornal poupa críticas ao governo do Estado e as concentra na “falta de ações dos governos locais” para impedir que os casos de dengue avançassem na absurda proporção desse ano. De certa maneira, podemos dizer que o Estadão tentou descaradamente “municipalizar” a dengue, escondendo os graves erros do governo tucano na execução de políticas públicas para evitar o surto da doença, como pode se visto no seguinte trecho do editorial:

Em 2010 a doença voltou a ameaçar seriamente o País e mesmo em São Paulo, o mais rico Estado da federação, o número de casos quadruplicou já em janeiro. Nos últimos três anos, o governo estadual investiu R$ 120 milhões no combate à dengue e megaoperações são organizadas sempre que aumenta o número de casos. Passado o perigo, há uma acomodação dos governos locais. Por causa da falta de continuidade no combate à doença, ela não demora a voltar.

Há pouco mais de um mês, levantamento da Secretaria de Estado da Saúde mostrou que a Baixada Santista voltou a ser recordista em número de casos de morte pela doença - das 120 vítimas registradas em São Paulo até então, 81 eram de cidades litorâneas. A região reunia 20% do total de casos de dengue no Estado
”.

Casos de dengue crescem 2000% em SP
A tentativa do editorial em deslocar a responsabilidade pelo crescimento da dengue em São Paulo do governo do Estado para os municípios é, no mínimo, esdrúxula. Para se ter uma idéia da expansão apocalíptica dos casos de dengue no estado, basta dizermos que eles cresceram nada menos que 2000%, passando de 9.710 ocorrências em 2009 para mais que 201 mil casos somente entre janeiro e outubro deste ano. Como a situação tende a piorar no final do ano, por conta da chegada do verão e do aumento das chuvas, esse número deve encerrar 2010 em patamar ainda mais expressivo.

Até este ano o recorde da dengue em São Paulo havia sido registrado em 2007, quando os casos em todo o estado atingiram 92,3 mil. Ou seja, o número de casos de dengue registrado nos dez primeiros meses de 2010 já é mais que o dobro do recorde anterior verificado no Estado, o que mostra claramente o descaso do poder público com o avanço da doença. Em algumas regiões do Estado, sobretudo no interior, a situação é mais que preocupante. Para medir a situação de alerta, os profissionais da saúde e responsáveis pelas políticas públicas usam o chamado Índice Rápido de Infestação do Aedes Aegypti (LIRAa), que quando atinge valores superiores a 1 já indica risco elevado de transmissão.

Em Ribeirão Preto, por exemplo, o LIRAa já atingiu 1,8 em novembro deste ano, revelando um quadro crítico da proliferação da doença naquela cidade. No litoral a situação não é menos dramática: em São Sebastião o índice já atinge 1,6. Esse quadro alarmante reflete, sobretudo, a irresponsabilidade do governo do Estado nesses últimos anos em relação a políticas de saúde pública para conter esse surto. Em primeiro lugar, o governo do PSDB se omitiu totalmente em relação à doença ao transferir para as prefeituras a responsabilidade pela execução de ações preventivas contra a dengue.

Em 2008, quando a dengue perdeu força no Estado, a gestão Serra reduziu substancialmente os recursos investidos para o combate à doença e prevenção contra uma nova epidemia. Naquele ano, nada menos que 2,2 milhões de pessoas deixaram de ser atendidas com visitas e trabalhos de controle de proliferação. Esse número representa 35% da meta que o próprio governo do Estado traçou para 2008 em seu Plano Plurianual (PPA) 2008-2011. Ou seja, bastou que o surto de dengue arrefecesse um pouco para o então governador José Serra (PSDB) afrouxar também as políticas de combate, cumprindo apenas 65% da meta de famílias visitadas.

Vale destacar que o governo tucano também não cumpriu, naquele ano, a meta de treinamento de pessoal para orientar a população contra a dengue, tendo sido treinados apenas 6 mil pessoas, o que representa dois terços da meta de 9 mil estipulada no PPA. Isso mostra a total irresponsabilidade do governo tucano em relação à execução de políticas públicas já estabelecidas no Plano Plurianual do Estado para impedir novos surtos de dengue. E o resultado dessa irresponsabilidade é este que vemos agora: uma explosão de mais de 2000% nos casos de dengue neste ano. Tentar culpar as prefeituras é ridículo, uma vez que políticas de prevenção e combate à dengue constam no PPA como responsabilidade do governo do Estado.

Terceirização da saúde torna atendimento precário
Agora, em uma parte de editorial, o Estadão acertou, ainda que não tenha esclarecido melhor a questão. É exatamente o trecho que se refere ao despreparo dos profissionais da saúde para o enfrentamento da questão, como pode se ver abaixo:

Tão preocupante quanto a explosão de casos é o despreparo dos profissionais da rede de saúde pública para o atendimento aos pacientes. Em Santos, 70% das pessoas contaminadas que perderam a vida só tiveram a doença diagnosticada
depois de passar por mais de um local de atendimento, ou então não receberam, no primeiro atendimento, o tratamento adequado.

Como sempre alertaram os sanitaristas, dengue não se combate apenas com o conhecido fumacê, os mutirões de limpeza nas periferias ou as advertências dos agentes de saúde às donas de casa que teimam em deixar água parada nos vasos de plantas. Um programa eficiente de combate à dengue tem de prever medidas que vão da vigilância permanente para evitar a formação de criadouros até a melhor qualificação das equipes de Saúde
”.
De fato, o estado de São Paulo vive mesmo um problema de atendimento precário por parte dos profissionais da saúde. O interessante é que esse problema começou a crescer à medida que os hospitais públicos de São Paulo começaram a ser administrados pelas chamadas OSs (Organizações Sociais de Saúde). Para se ter uma idéia, em algumas regiões do estado, como o ABC paulista, 90% dos funcionários da saúde são terceirizados, de acordo com dados do SindSaúde. Dos 2,3 mil profissionais de saúde que prestam atendimento na área, apenas 230 são contratados diretamente pelo Estado: todo o restante presta serviço às OSs.

Logo, se a precarização do serviço prestado pelos profissionais de saúde amplia-se na mesma proporção em que hospitais são transferidos para administração das OSs, só pode se chegar à conclusão de que é exatamente essa terceirização da saúde pública do estado de São Paulo que tem reduzido a qualidade do serviço prestado aos pacientes. Como não é novidade para ninguém que na cartilha tucana o que interessa é apenas custo e não qualidade nos serviços prestados à população, não causa admiração esse tipo de postura do governo de São Paulo. Não adianta os grandes jornalões quererem transferir a responsabilidade do caos para os municípios, já que os dados são muito claros ao mostrarem que o governo tucano não cumpriu com suas próprias metas.

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Exclusivo: mosquitos da dengue declaram apoio a Serra

Ironia da (in)segurança pública tucana: bandidos assaltam presídio no interior de SP

Que segurança pública não seja lá o forte dos tucanos, isso não é novidade para ninguém. Agora, a história que se segue, de tão surreal que é, até parece uma piada. Mas infelizmente não é. Aconteceu nessa quinta-feira, 23, no interior de São Paulo, estado administrado pelo PSDB há 16 anos. À primeira vista, seria apenas mais um assalto a constar nas longas estatísticas do estado mais rico da federação, não fosse apenas um pequeno detalhe: os bandidos não assaltaram uma casa ou um comércio, mas sim um presídio! Sim, é exatamente isto que está escrito. Confira abaixo a reportagem do Estadão do dia 24 de dezembro:

Seis homens armados entraram ontem (23), às 6h40, no Instituto Penal Agrícola(IPA) de São José do Rio Preto e roubaram R$ 180 mil. O dinheiro serviria para pagar os salários dos cerca de mil presos que cumprem pena em regime semiaberto no IPA, trabalhando na unidade prisional. Um agente ficou ferido.

Era com esse dinheiro que muitos deles contavam para pagar passagens de ônibus e visitar seus parentes e comprar presentes de Natal para seus filhos. O malote com o dinheiro do chamado pecúlio dos presos foi levado pelos assaltantes. Os criminosos entraram no IPA e dominaram os agentes prisionais que estavam na portaria - eram 15 agentes de segurança penitenciária e outros dez funcionários e diretores do lugar.

Os presos do semiaberto estavam recebendo o pagamento quando o bando chegou. Os criminosos dominaram o motorista de uma van que ia transportar os detentos do presídio para a rodoviária para fugir - ela foi abandonada depois. Os ladrões feriram um agente, que foi levado à Santa Casa da cidade, medicado e liberado
.”

Mais surrealismo na segurança pública de São Paulo
Quem pensa que esse assalto ocorrido no IPA, que está prestes a ser substituído por um CPP (Centro de Progressão Penitenciária), é um ponto fora da curva, engana-se totalmente. Casos como este, de tão freqüentes no estado de São Paulo, já estão deixando até de serem considerados surreais. Em abril deste ano, por exemplo, foi encontrado próximo ao Presídio de Avaré, também no interior de São Paulo, um estilingue gigante, que seria usado por criminosos para atirar celulares para dentro do presídio, como pode ser visto aqui.

A audácia dos bandidos parece não ser maior apenas que a ineficiência das políticas de segurança pública do governo tucano em São Paulo. Vale lembrar que neste ano, os principais indicadores de segurança interromperam uma série de melhoras e voltaram a registrar um aumento da criminalidade em todo o estado, mas, sobretudo, no interior. Como pode ser visto neste artigo, houve uma piora generalizada dos índices de criminalidade logo no início desse ano. Apesar da taxa de homicídios continuar caindo, outros tipos de crime, como o tráfico de drogas, tem aumentado sistematicamente no estado.

Inclusive, o tráfico de entorpecentes tem sido um problema muito grave no Estado de São Paulo, como mostram os números da própria Secretaria de Segurança Pública. Para se ter uma idéia, no 3º trimestre deste ano foram registradas em todo o estado 8.043 ocorrências de crimes relacionados ao tráfico de drogas, o que representa um forte crescimento de 11,3% na comparação com igual período de 2009. A maior incidência do tráfico tem sido no interior: entre julho e setembro de 2010, foram 5.365 ocorrências de tráfico de drogas, 12,7% acima do mesmo trimestre do ano anterior. Vale destacar que no acumulado do ano, o tráfico de entorpecentes no estado é 11,2% superior ao acumulado entre janeiro e setembro do ano passado.

Isso mostra que, não obstante à queda na taxa de homicídios verificada no estado e tão alardeada pelo governo tucano, o tráfico de drogas constitui, hoje, um grave problema para a segurança pública paulista. Seu combate passa necessariamente por maiores investimentos em inteligência policial, para que possam ser descobertas e desmontadas as principais conexões da rede do narcotráfico no estado. É preciso que a Secretaria de Segurança Pública encontre uma solução rápida para este problema, pois suas próprias estatísticas revelam um crescimento absurdo dessa modalidade de crime nos últimos trimestres.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Quem te viu, quem te vê: a opinião da Veja sobre Lula logo após a derrota na eleição de 89

Há exatos 21 anos, no dia 24 de dezembro de 1989, chegava às bancas a primeira edição da revista Veja após o segundo turno das primeiras eleições presidenciais diretas pós-redemocratização, realizado no dia 17 daquele mês. A capa da revista trazia estampada, naturalmente, a foto do candidato vitorioso naquele pleito, o até então ex-governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello. Além de uma extensa reportagem de capa sobre o “estilo pessoal e de poder” do recém-eleito presidente, que mostrava desde os familiares de Collor até os seus perfumes prediletos, e de uma matéria sobre os “abacaxis” que Collor teria que descascar a partir de março de 1990, quando tomaria posse, a Veja também trouxe uma matéria sobre o candidato derrotado nas urnas naquela eleição – o então ex-metalúrgico Lula.

A campanha de 1989 é lembrada até hoje por ter sido uma das campanhas mais animadas – e radicalizadas – desde a redemocratização do Brasil. Após um primeiro turno com a presença de grandes figuras da cena política brasileira – como Mário Covas, Leonel Brizola, Ulysses Guimarães, dentre muitos outros – eis que chegam ao segundo turno Collor e Lula. Após uma eleição extremamente disputada, que até o último instante mostrava empate técnico entre os dois candidatos, Collor venceu por pequena margem de votos. A matéria reproduzida a seguir – e intitulada “A queda da estrela” - é da edição nº 1110 da Veja, de 24 de dezembro de 1989. É interessante ver a análise que a reportagem faz sobre Lula, dando a entender que a derrota naquele ano não foi um fracasso e que o ex-metalúrgico consolidou-se como líder da oposição ao novo governo. É um documento histórico muito interessante, especialmente se compararmos com o tom folhetinesco que a Veja assumiu desde a década de 90.

A queda da estrela
"Durante os trinta dias de campanha entre o primeiro e o segundo turno da eleição, o candidato do PT, Luis Inácio Lula da Silva, 44 anos, alimentou uma esperança fundada no mais puro realismo: ocupar a cadeira do presidente José Sarney no Palácio do Planalto pelos próximos cinco anos. Até a hora da verdade Lula estava virtualmente empatado com seu adversário do PRN, Fernando Collor de Mello, realizara os maiores e mais animados comícios da temporada e parecia muito perto de transformar seu sonho de candidato numa festa regada a discursos de comemoração. Quando as urnas do segundo turno foram abertas, porém, o sonho de Lula virou pó e a cadeira do presidente Sarney escapou-lhe por pouco das mãos. Para quem entrou na campanha como azarão, bateu políticos como Leonel Brizola e Mário Covas no primeiro turno e quase chegou lá, a derrota carrega todos os ingredientes da frustração, mas nada tem de humilhante.

Ao contrário, Lula sai desta eleição robustecido em relação ao personagem que ele encarnava um ano atrás. Com seu passado de líder operário, de deputado bom de voto e, agora, de um homem capaz de puxar os votos de metade do país numa corrida presidencial – tudo isso com o reforço da teia política e sindical que é o PT -, Lula se credencia como carta forte em qualquer eleição e, desde já, emerge como um dos pilares da oposição ao novo governo no país.

“Lula credenciou-se para fazer oposição como ninguém antes”, afirma o deputado Paulo Delgado, do PT de Minas Gerais. O desempenho de Lula na eleição, na verdade, surpreendeu a própria direção do partido, que tratava a sua candidatura apenas como uma etapa na estratégia de chegar ao poder – algo vislumbrado como possível, no cronograma dos teóricos petistas, somente em 1994. Fora do PT, também se duvidava das chances de um ex-metalúrgico chegar à Presidência da República na primeira eleição direta em 29 anos. Havia a questão do despreparo intelectual de Lula, em comparação aos bacharéis que normalmente disputam eleições nesse patamar. Imaginava-se ainda que o radicalismo do PT deixaria a grande maioria do eleitorado na defensiva. Além disso, faltava experiência tanto ao candidato quanto à sua máquina de sustentação.

Desacreditado na largada, Lula saltou para o primeiro lugar nas pesquisas realizadas no início do ano, com 10% das intenções de voto. Nem assim passou a ser visto como peça de grande realce no tabuleiro da sucessão. Entre julho e agosto, Lula recuou para os 5% nas pesquisas de opinião – e algum tempo depois chegou a ser considerado carta fora do baralho. Nesses meses, com o caixa da campanha em baixa, o candidato do PT viajava pelo país em aviões de carreira e passava horas intermináveis nos aeroportos.

Para Lula, que entrou na sucessão com poucas esperanças, mas passou a acreditar firmemente na vitória com a proximidade das eleições, a derrota foi um baque. Nas semanas anteriores ao segundo turno, Lula já demonstrava sinais de nervosismo e tensão – alternava momentos de descontração e mau humor, especialmente pela manhã, depois de dormir menos de quatro horas em função dos desumanos compromissos de campanha. Em situação normal, Lula é uma pessoa agradável, distendida e bem humorada. Nos momentos tensos do final de campanha, era outra pessoa. Na segunda-feira dia 11, o estado de alta ansiedade do candidato piorou com o depoimento de sua ex-namorada Mirian Cordeiro, apresentado no horário eleitoral do PRN.

Embora estivesse esperando que algo desse tipo fosse mostrado na campanha, Lula não estava preparado para a intensidade e a rudeza do ataque. O golpe acertou-lhe a boca do estômago e funcionou como uma espécie de balde de água fria no entusiasmo que tomou conta do partido duas semanas antes da eleição – com o crescimento nas pesquisas, começou-se a acreditar, de fato, na possibilidade de vitória. Lula foi mal do dia seguinte no debate na TV, deixou sem resposta os ataques mais duros de Collor e apareceu como o aluno que entra numa prova despreparado. Já tinha se apresentado muito melhor em debates anteriores. Lula voltou para casa desanimado e, naquele momento, passou pela sua cabeça, pela primeira vez em várias semanas, que poderia não chegar lá. Nos comitês de campanha e nas sedes do partido, os militantes ainda tentaram reverter a onda de desânimo com a organização do trabalho de boca de urna para o dia 17. Quando as urnas foram fechadas, no final da tarde daquele dia, porém, o que o PT mais temia estava selado – Lula quase chegou lá.

Com a derrota, abriram-se, na semana passada, duas discussões sobre o futuro dentro do PT – o futuro do próprio Lula e o do partido. Deputado sem muita expressão na Assembléia Nacional Constituinte, Lula mostrou-se um político mais preparado e maduro durante a campanha presidencial. Ele foi capaz, sem dúvida, de ampliar notavelmente sua base eleitoral – do contrário, teria ficado nos 16% de votos que teve no primeiro turno e demonstrado que é um candidato de possibilidades excessivamente estreitas. Atribuiu-se a Lula, também, a maior parte do sucesso obtido nos acordos com Leonel Brizola, do PDT, e Mário Covas, do PSDB, para a eleição do segundo turno.

Além disso, ficou comprovado, pelo número de participantes nos comícios, pelo seu desempenho nos palanques e por sua votação final que Lula é um político com uma rara qualidade – carisma. Por essas condições pessoais, Lula, com apenas 44 anos de idade, parece ter um futuro tranqüilo pela frente. Mesmo as facções do PT mais refratárias à sua liderança terão de continuar admitindo que ele permanece como o número 1 do partido, e não como um fracassado de quem é preciso livrar-se – o que, entre outras coisas, o faz, desde já, um forte candidato a disputar o governo de São Paulo no ano que vem.

O futuro do PT é um assunto mais complicado. O problema que virá a tona depois que a poeira da eleição baixar é a disputa nunca resolvida e sempre feroz entre as facções internas do partido. Durante a campanha, particularmente na disputa do segundo turno, Lula utilizou uma linguagem moderada que desagradou às numerosas facções radicais de sua legenda. Como as derrotas têm o dom de ampliar, e até de exagerar, os erros cometidos pelos derrotados, é quase certo que os dois lados se engalfinharão na troca de acusações sobre quem fica com a responsabilidade. O desafio do PT, portanto, será encontrar a melhor maneira de manter com vida o que a campanha trouxe de positivo para o partido. Não conseguindo isso, a derrota do dia 17 terá sido o que é, tristemente, a maioria das derrotas – apenas uma derrota".

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

O abraço fraterno de um líder em seu povo

Mais que um discurso de despedida ou o balanço de governo de um Presidente a poucos dias de deixar o cargo, o pronunciamento à Nação feito por Lula na noite desta quinta-feira, 23, foi um verdadeiro abraço de vitória dado em todo o povo brasileiro. Vitória que vai além do aspecto eleitoral, que deve ser vista para além da passagem da faixa presidencial para Dilma Rousseff, a candidata escolhida por Lula e pela maioria dos brasileiros, que através do seu voto em outubro deste ano legitimaram a vitória da petista. Falamos aqui da vitória popular, da vitória de um povo que nestes últimos anos conquistou a estabilidade macroeconômica, o avanço social, a geração de milhões de empregos e, sobretudo, a confiança em um amanhã melhor.

Hoje, cada brasileira e cada brasileiro acredita mais no seu país e em si mesmo. Trata-se de uma conquista coletiva de todos nós. Se algum mérito tive, foi o de haver semeado sonho e esperança. Meu sonho e minha esperança vêm das profundezas da alma popular, do berço pobre que tive e da certeza de que com luta, coragem e trabalho a gente supera qualquer dificuldade. E quando uma pessoa do povo consegue vencer as dificuldades gigantescas que a vida lhe impõe, nada mais consegue aniquilar o seu sonho nem sua capacidade de superar desafios. E quando um país como o Brasil cuja maior força está na alma e na energia popular passa a acreditar em si mesmo, nada, absolutamente nada, detém sua marcha inexorável para a vitória”.

Falamos também da vitória conquistada pelo povo ao ver ali, ocupando o posto mais alto do Executivo nacional, um ex-operário, que viveu na pele o sofrimento que milhões de brasileiros passam no dia-a-dia. Lula é mais que um Presidente ou um Estadista. Porque Presidentes ou Estadistas nem sempre guardam com o povo a relação que Lula conseguiu estabelecer: por mais que sejam próximos da população, poucos são os que conseguem o que Lula conseguiu. Lula é o povo. Lula representa milhões de brasileiras e brasileiros que, em meio aos percalços cotidianos, transformam as adversidades em força para seguir na luta.

Foi com essa energia no peito que nós, brasileiros e brasileiras, afugentamos a onda de fracasso que pairava sobre o país quando assumimos o governo. Agora estamos provando ao mundo e a nós mesmos que o Brasil tem um encontro marcado com o sucesso. Se governei bem foi porque, antes de me sentir presidente, me senti sempre um brasileiro comum que tinha que superar suas dores, vencer os preconceitos e não fracassar. Se governei bem foi porque, antes de me sentir um chefe de Estado, me senti sempre um chefe de família, que sabia das dificuldades dos seus irmãos para colocar comida na mesa, para dar escola para seus filhos, para chegar em casa todas as noites a salvo dos perigos e da violência”.

E se Lula representa o próprio povo, ele tem um olhar que outros chefes de Estado que o antecederam não tiveram. Lula veio do povo e, assim sendo, não teve o olhar elitista que marcou épocas anteriores. Lula foi o Presidente que governou para todos os brasileiros e não apenas para uma minoria, deixando a maioria de fora. Em um país tão grande, seja nas suas dimensões continentais ou na sua diversidade cultural, Lula mostrou que um governo só é amado e respeitado pelo povo se não ignora a maioria. Lula mostrou também que é possível sim governar com coração e com a razão, ainda que as elites – aquelas que governaram o país por tanto tempo e nada fizeram pelo povo – diga que isso é populismo.

Se governamos bem foi, principalmente, porque conseguimos nos livrar da maldição elitista que fazia com que os dirigentes políticos deste grande país governassem apenas para um terço da população e se esquecessem da maioria do seu povo, que parecia condenada à miséria e ao abandono eternos. Mostramos que é possível e necessário governar para todos, e quando isso se realiza, o grande ganhador é o país”.

Lula mostrou ao povo a importância de se quebrar tabus. Houve um tempo em que a elite quis que o povo acreditasse que era necessário primeiro fazer o bolo crescer para depois distribuir. Houve um tempo em que a elite quis que o povo acreditasse que ele – povo – nunca poderia chegar à Presidência e que este cargo só poderia ser ocupado por doutores que ostentassem em suas paredes diplomas e títulos acadêmicos. Houve um tempo também em que quiseram que o povo acreditasse que o Brasil era um país de terceiro mundo, mas que estava caminhando para no futuro ser um país melhor. E esse futuro nunca chegava. Houve um tempo em que o machismo da elite não admitia uma mulher na Presidência. Lula rompeu todos esses tabus.

A minha maior felicidade é saber que vamos ampliar todas essas conquistas. Minha fé se alicerça em três fundamentos: as riquezas do Brasil, a força do seu povo e a competência da presidenta Dilma. Ela conhece, como ninguém, o que foi feito e como fazer mais e melhor. Tenho certeza de que Dilma será uma presidenta à altura deste novo Brasil, que respeita seu povo e é respeitado pelo mundo. Este país que, depois de produzir seguidos espetáculos de crescimento e inclusão, vai sediar os dois maiores eventos do Planeta: a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Este país, que reduziu a desigualdade entre as pessoas e entre as regiões, e vai seguir reduzindo-a muito mais. Este país, que descobriu que não há maior conquista do que recuperar a autoestima do seu povo”.

Lula mostrou aos brasileiros que não se pode fugir das lutas, por maiores que elas sejam. Imaginem a primeira coisa que passou pela cabeça do nosso Presidente quando ele subiu aquela rampa, em 1º de janeiro de 2003, e passou a ser oficialmente o responsável por milhões de brasileiros. Quem naquele dia apostou que Lula se deslumbraria com o poder e esqueceria suas raízes, enganou-se totalmente. E por não renegar sua origem e trabalhar arduamente pelo povo, Lula foi apoiado pelos brasileiros, inclusive nos momentos mais difíceis de seu governo.

Quero encerrar com um pedido enfático e um agradecimento profundo. Peço a todos que apoiem a nova presidenta, assim como me apoiaram em todos os momentos. Isso também significa cobrar, na hora certa, como vocês souberam me cobrar. A cobrança foi um estímulo para que a gente quisesse fazer sempre mais, e o amor de vocês foi a minha grande energia e o meu principal elemento. Agradeço a vocês por terem me ensinado muitas lições e por terem me fortalecido nas horas
difíceis, e ampliado a minha alegria nas horas alegres. Saio do governo para viver a vida das ruas. Homem do povo que sempre fui, serei mais povo do que nunca, sem renegar o meu destino e jamais fugir à luta
”.

Como um abraço bem forte, aqueles de carinho fraterno mesmo, assim são as palavras de despedida de Lula. Mais que as palavras de um Presidente ou de Estadista, mas as palavras de um companheiro, que agora após colocar o Brasil nos rumos do desenvolvimento, retorna às suas origens com seu dever cumprido. Dentro de oito dias, Lula passará a faixa à companheira Dilma, escolhida por mais de 55 milhões de brasileiros para dar continuidade a este governo exitoso iniciado há oito anos. E o que acontecerá com Lula? Lula estará para sempre no coração de milhões de brasileiros.

Não me perguntem sobre o meu futuro porque vocês já me deram um grande presente. Perguntem, sim, pelo futuro do Brasil e acreditem nele porque temos motivo de sobra para isso. Minha felicidade estará sempre ligada à felicidade do meu povo. Onde houver um brasileiro sofrendo, quero estar espiritualmente ao seu lado; onde houver uma mãe ou um pai com desesperança, quero que minha lembrança lhes traga um pouco de conforto; onde houver um jovem que queira sonhar grande, peço-lhe que olhe a minha história e veja que na vida nada é impossível. Vivi no coração do povo e nele quero continuar vivendo até o último dos meus dias. Mais que nunca, sou um homem de uma só causa e essa causa chama-se Brasil. Um feliz Natal e um próspero Ano Novo, e muito obrigado por tudo”.

Com menos recursos no Orçamento, transporte não é prioridade do PSDB em SP

Infra-estrutura viária e modernização dos transportes metropolitanos parecem não ser uma prioridade para o governo tucano em São Paulo. Isto porque, de acordo com a peça orçamentária enviada pelo governador do Estado, Alberto Goldman, à Assembléia Legislativa de São Paulo (Alesp) e aprovada nesta semana, o montante de investimentos em transportes sofrerá forte redução em 2011. Essa redução das verbas orçamentárias afeta tanto a Secretaria de Transportes (que cuida, basicamente, da infra-estrutura de transportes no Estado) quanto na Secretaria de Transportes Metropolitanos (responsável pelo Metrô e CPTM).

Para se ter uma idéia, os investimentos na área de Transportes sofrerão redução de 16,1% em 2011, na comparação com a lei orçamentária deste ano, passando de R$ 5,3 bilhões para R$ 4,4 bilhões neste período. Esse recuo de quase R$ 1 bilhão no orçamento da pasta decorre, sobretudo, de uma redução de 41% nas verbas que serão disponibilizadas para programas de ampliação, recuperação e modernização da malha rodoviária em 2011. Para o próximo exercício, o orçamento para estes programas será de R$ 2,1 bilhões, bem abaixo, portanto, do montante de R$ 3,5 bilhões destinados a estes fins no orçamento deste ano.

Vicinais, mesmo em péssimo estado, terão menor investimento
Chama especial atenção a redução de 60% nos recursos destinados à recuperação, pavimentação e recapeamento de estradas vicinais no Estado. Enquanto o orçamento deste ano destinou R$ 103 milhões para as estradas vicinais, em 2011 a área receberá apenas R$ 41 milhões. E o pior de tudo: as estradas vicinais no Estado de São Paulo, a despeito do que dizem os comerciais do governo estadual, estão em péssimo estado de conservação. O interessante é que pelo menos na teoria o dinheiro pago pelas concessionárias das grandes rodovias ao Estado deveria ser utilizado para melhoria das condições das vicinais, o que não está acontecendo.

Uma auditoria do TCE (Tribunal de Contas do Estado) em estradas que passaram por obras entre fevereiro de 2008 e julho de 2009 revelou que cerca de 70% das vias vistoriadas pelo órgão (todas paulistas e gerenciadas pelo poder público) apresentaram ao menos um tipo de defeito após um ano da conclusão definitiva da reforma. De acordo com o relatório do Tribunal, os problemas vão de afundamentos e trincas no pavimento a remendos e buracos. E o mais importante: das 67 obras vistoriadas, dois terços delas eram vicinais, que, em tese, deveriam estar recuperadas pelo programa Pró-Vicinais, do governo do Estado.

Temos aí, portanto, um duplo problema: primeiro, o engodo eleitoral alardeado pelo ex-governador José Serra (PSDB) durante as eleições, de que muito foi investido em recuperação das estradas vicinais. E em segundo lugar, a redução dos investimentos programados para 2011 neste tipo de via rodoviária, não obstante às péssimas condições de conservação das mesmas. Se as estradas vicinais estão nessa situação de total deterioração, conforme verificado pelo TCE, como pode o Executivo estadual reduzir a previsão de investimentos na recuperação destas rodovias? Além de onerar milhares de paulistas em função do aumento do custo logístico, os menores investimentos ampliam consideravelmente os riscos de acidentes nestas estradas.

Investimentos em transportes metropolitanos caem 11%
Além de menos recursos disponíveis para a Secretaria de Transportes, a peça orçamentária aprovada pela Alesp destina menos dinheiro também para a Secretaria de Transportes Metropolitanos em 2011. Para se ter uma idéia, enquanto este ano os investimentos para a área estavam orçados em R$ 9,5 bilhões, para 2011 os investimentos previstos são de apenas R$ 8,5 bilhões, ou seja, 11% a menos do que no atual exercício. Os investimentos em transportes metropolitanos são essenciais para São Paulo, uma vez que são direcionados para a região que apresenta o maior gargalo do Estado em transporte público.

De acordo com o Orçamento 2011, os recursos destinados a programas de modernização dos sistemas metroviários e ferroviários sofrerão corte de 80%, passando de R$ 2 bilhões neste ano para R$ 406 milhões no próximo exercício. Com essa forte queda, o orçamento para a rubrica de Gestão Estratégica do Transporte Metropolitano caiu pela metade, atingindo R$ 1,2 bilhão frente aos R$ 2,4 bilhões constantes no orçamento deste ano. Esta queda representa menos recursos para a aquisição de novos trens tanto pelo Metrô quanto pela CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). Vale lembrar, contudo, que os recursos para expansão do metrô não estão nesta rubrica.

Mesmo com o aumento em 5% do volume de recursos orçados para investimentos na expansão do metrô em 2011, a queda geral no orçamento para Transportes e Transportes Metropolitanos não é um bom indicativo, pois estas áreas representam um grande gargalo do Estado de São Paulo. Considerando que o Orçamento de 2011 foi aprovado com previsão subestimada de receitas, se o governo do Estado tivesse feito uma projeção real seria possível elevar ou pelo menos manter o nível de investimentos nestes setores tão importantes para o Estado. Como dito anteriormente, ao que tudo indica, transporte definitivamente não é prioridade para o governo tucano.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Engodo tucano em SP: PSDB ignora demandas e aprova Orçamento subestimado para 2011

Além de “presentear” o povo paulista com a aprovação de um projeto de lei que reserva 25% dos leitos em hospitais públicos de São Paulo para usuários de planos de saúde, a base aliada dos tucanos aprovou, também na noite de terça-feira, 21, a vergonhosa proposta orçamentária para 2011 enviada à Assembléia Legislativa (Alesp) pelo Executivo estadual. Entre os muitos problemas da peça orçamentária aprovada na Alesp pelos tucanos e aliados pode-se apontar principalmente o fato das receitas para o próximo exercício estarem subestimadas, não levantando em conta projeções reais para a arrecadação tributária.

Neste sentido, o projeto orçamentário enviado pelo Executivo paulista à Alesp orça as receitas e fixa as despesas para 2011 em R$ 140,6 bilhões. Para se ter uma idéia do que isso significa, basta dizer que no orçamento para este ano estavam previstas receitas de R$ 125,8 bilhões. Contudo, de acordo com dados da Secretaria da Fazenda, entre janeiro e outubro as receitas já somavam R$ 115 bilhões (excluindo-se mais de R$ 9 bilhões referentes a receitas intra-orçamentárias). Isso representa uma média de R$ 11,5 bilhões em receitas mensais: ou seja, no acumulado dos doze meses de 2010 as receitas do governo do Estado devem chegar a R$ 138 bilhões.

Esse patamar é 9,5% superior à previsão de receita constante no orçamento de 2010, o que mostra que essa prática de subestimar a receita orçamentária não é recente em se tratando de governos tucanos. Sigamos com os cálculos: se o orçamento aprovado para 2011 aponta receitas da ordem de R$ 140,6 bilhões, isso significa que o governo do Estado está trabalhando com uma margem de crescimento de apenas 1,9% frente à receita realmente alcançada neste ano. Isso é patético, uma vez que o próprio projeto trabalha com uma expectativa de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) paulista de 4,5% para 2011. Se é esperado que o PIB cresça nessa velocidade, como pode a receita projetada crescer menos que 2%?

Parecer do relator mostra subserviência ao Executivo
Não bastasse o projeto orçamentário enviado pelo Executivo subestimar a receita para 2011, pior ainda foi o fato do relator do projeto, o deputado estadual Bruno Covas (PSDB), dar parecer favorável a essa afronta do governo do Estado, em uma postura totalmente subserviente ao Palácio dos Bandeirantes. Para se ter uma idéia, nas 15 sessões em que ficou em tramitação, o projeto orçamentário recebeu nada menos que 11.119 emendas apresentadas pelos parlamentares. Após serem retiradas 10 emendas, restaram, finalmente, 11.109 emendas ao projeto orçamentário. Todas estas mais de 11 mil emendas foram praticamente rejeitadas no relatório de Bruno Covas, que deu uma verdadeira “banana” para as demandas do povo de São Paulo.

A única alteração no texto-base feita pelo relator foi o acréscimo de R$ 50 milhões de Receita à peça orçamentária enviada pelo Executivo, o que representa meros 0,04% frente à receita orçada de R$ 140,6 bilhões. Essa “significativa” elevação na receita também não é novidade em se tratando de relatorias tucanas: se formos observar os últimos projetos orçamentários aprovados poderemos constatar que a cada ano os acréscimos feitos pelos relatores são menores. Na proposta orçamentária de 2008, por exemplo, o Executivo orçou as receitas em R$ 95,2 bilhões. Em seu parecer na época, o relator Samuel Moreira elevou esse montante apenas em R$ 1,67 bilhão, ou seja, 1,76%. E essas elevações foram cada vez menores, como se pode ver na tabela abaixo.

De acordo com estudos da bancada do PT na Alesp, considerando-se os valores efetivamente arrecadados até o quinto bimestre deste ano para a receita tributária (mais de R$ 85 bilhões) e os valores previstos para o sexto bimestre pelo governo do Estado, a arrecadação tributária em 2010 deve atingir nada menos que R$ 100,8 bilhões. Na peça orçamentária para 2011 apresentada pelo Executivo – e que não foi modificada pelo relator Bruno Covas – as projeções são de que a receita tributária atinja R$ 109,7 bilhões no exercício, o que representa um crescimento de 8,8% em relação à arrecadação prevista para 2010.

Contudo, se formos levar em conta a média de crescimento da receita tributária entre 2004 e 2008 – calculada em 14% -, as receitas tributárias devem atingir quase R$ 115 bilhões em 2011, ou seja, R$ 5,2 bilhões acima do projetado pelo Executivo paulista. Esses recursos seriam mais que suficientes para atender demandas de setores que ficaram “a ver navios” na atual proposta orçamentária, como é o caso dos funcionários do Judiciário, por exemplo. Assim como para as demais categorias do funcionalismo estadual, o Orçamento para 2011 não prevê praticamente nenhuma possibilidade de reajuste aos já arrochados salários dos servidores da Justiça, que fizeram, este ano, a maior greve já vista no Judiciário paulista.

A peça orçamentária para 2011 reserva R$ 5,6 bilhões para o Judiciário, um valor que desperta dúvidas nos servidores públicos se de fato o Tribunal de Justiça terá condições de honrar os acordos firmados para colocar fim à greve de mais de quatro meses ocorrida neste ano. Se o relator do Orçamento tivesse levado em conta as projeções reais de crescimento da receita tributária para o período, poderia ter alocado R$ 1 bilhão a mais para o Judiciário, o que representa um valor 18% superior à dotação inicial que consta no projeto enviado pelo Executivo. Com estes recursos adicionais, certamente o Tribunal de Justiça teria condições de honrar os acordos firmados neste ano para pôr fim à greve do funcionalismo.

Cheque em branco para Alckmin
Não bastassem as projeções subestimadas de receita, o que na prática favorece remanejamentos de receitas extras pelo governador eleito Geraldo Alckmin (PSDB), o projeto orçamentário prevê limites vergonhosos para a criação de créditos suplementares pelo Executivo. Quando falamos em créditos suplementares, estamos nos referindo a recursos orçamentários que podem ser remanejados pelo Executivo estadual sem necessitar da aprovação do Legislativo, desde que não incorram em aumento da despesa orçamentária. Isso é problemático porque fere frontalmente a lei orçamentária debatida e aprovada pelo Legislativo. Segundo o artigo 8º do projeto orçamentário o Executivo está autorizado a abrir créditos suplementares até o limite de 17% da despesa total fixada.

Isso significa dizer que o governador eleito Geraldo Alckmin poderá remanejar nada menos que R$ 24 bilhões de acordo com sua vontade, sem precisar da autorização do Legislativo. Isso nada mais é que um verdadeiro “cheque em branco” dado pela bancada governista da Alesp ao Palácio dos Bandeirantes. Além disso, o artigo 8º também prevê a criação de outros créditos adicionais que não são computados nesse limite de 17%. Ou seja, na prática, o governador eleito terá um poder de remanejamento muito maior que esses 17%. De acordo com o parágrafo primeiro do inciso II do artigo 8º do projeto de lei orçamentária, “não onerarão o limite previsto no inciso I, os créditos:

1. destinados a suprir insuficiências nas dotações orçamentárias, relativas a
inativos e pensionistas, honras de aval, débitos constantes de precatórios
judiciais, serviços da dívida pública, despesas de exercícios anteriores e
despesas à conta de recursos vinculados, até o limite de 9% (nove por cento) do
total da despesa fixada no artigo 4º desta lei.
2. abertos mediante a
utilização de recursos na forma prevista no artigo 43, § 1º, inciso III, da Lei
federal nº 4.320, de 17 de março de 1964, até o limite de 20% (vinte por cento)
do total da despesa fixada no artigo 4º desta lei”.

Percebe-se, dessa maneira, que o orçamento aprovado na Alesp é uma verdadeira vergonha para São Paulo. Ao subestimar as projeções para receitas em 2011, a base aliada do Palácio dos Bandeirantes, responsável pela aprovação do texto orçamentário, votou contra o povo paulista, pois ignorou as demandas de diversos setores da população do Estado. Se tivessem sido consideradas as projeções reais para crescimento da receita tributária, como apontado pelo estudo da bancada do PT, muito mais recursos poderiam ser investidos em educação, saúde e outras áreas primordiais, como o funcionalismo público. Ao que tudo indica, respeito ao povo é algo que definitivamente os tucanos desconhecem.

Saúde de joelhos em SP: tucanos aprovam projeto que privatiza leitos do SUS no Estado

Apesar da pressão contrária das diversas entidades ligadas à saúde pública do Estado de São Paulo e também da bancada de oposição na Assembléia Legislativa (Alesp), os tucanos conseguiram aprovar, em uma votação que se estendeu até altas horas da noite de terça-feira, 21, o PLC (Projeto de Lei Complementar) 45/10, que reserva até 25% dos leitos públicos para usuários de planos de saúde em São Paulo. Contando com largo apoio da base governista na Alesp, o Palácio dos Bandeirantes conseguiu aprovar o PLC enviado ao Legislativo pelo governador Alberto Goldman (PSDB) por 55 votos favoráveis, frente a 18 votos contrários.

Como se trata de um projeto de lei complementar, eram necessários apenas 48 votos favoráveis para que ele fosse aprovado, um número inferior, portanto, ao tamanho da base de apoio ao governador tucano na Assembléia. Na última quinta-feira, 16, o PSDB chegou a colocar o absurdo projeto em votação, mas a bancada do PT conseguiu obstruir, não atingindo o quorum necessário para aprovação do mesmo. Contudo, na sessão desta terça-feira a base aliada do Palácio dos Bandeirantes compareceu em peso à votação (até mesmo porque estava sendo votada a também polêmica peça orçamentária enviada pelo Executivo paulista), garantindo assim a aprovação desse projeto que privatiza leitos em São Paulo.

Mais uma vez os tucanos votam contra o povo ao aprovarem um projeto dessa natureza. Ao estipular uma reserva de leitos em até 25%, o governo do PSDB em São Paulo está criando uma fila dupla nos hospitais públicos, ferindo frontalmente o princípio da equidade do SUS (Sistema Único de Saúde). Como já dito por este blog, a razão para a aprovação desse projeto vai muito além da sanha privatista dos tucanos: o governador eleito Geraldo Alckmin, também do PSDB, espera, com essa lei, conseguir recursos para fazer frente ao crescimento explosivo das despesas correntes na Saúde, uma herança do ex-governador José Serra que queria, com isso, fazer vitrine eleitoral para a campanha presidencial.

Ministério Público diz que projeto é inconstitucional
Uma esperança para que o SUS não seja destruído em São Paulo são as recentes manifestações contrárias do Ministério Público paulista sobre esse famigerado projeto de lei do governador tucano. De acordo com o promotor de Direitos Humanos especializado em Saúde Pública, Arthur Pinto Filho, “este projeto é inconstitucional e tem vários vícios em sua origem. O primeiro deles é querer que uma lei estadual restrinja o que uma lei federal não restringe, quando uma lei estadual não pode contrariar uma lei federal, exceto se for para aumentar o benefício da sociedade, o que não é o caso”.

Além disso, “a justificativa de que é necessário aprovar o projeto para criar formas de o governo cobrar as empresas é falso porque leis já existem. Se trata, isso sim, de tirar um de cada quatro leitos do SUS e entregá-los aos planos privados. O que já era pouco e ruim vai se tornar dramático e pior”, afirma o promotor. De fato, esse blog já desmontou esse argumento tucano de que o projeto de lei seria necessário para garantir o reembolso ao SUS por atendimentos e serviços prestados a pacientes de convênios privados. Já existe uma Lei Federal de 1998 e uma Lei Estadual de 1994, de autoria do então deputado estadual Arlindo Chinaglia (PT), que garante esses reembolsos. Para que então uma nova lei?

Para se ter uma idéia da gravidade deste projeto, até a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), entidade pública que regulamenta o setor de planos de saúde, faz ponderações sobre o mesmo. A agência destaca, por exemplo, que o projeto precisa ser melhor detalhado para que se evitem distorções, como o atendimento discriminatório. Segundo o diretor de Fiscalização da ANS, Eduardo Sales, “em tese, pela Constituição Federal, todos têm direito de acesso aos serviços e ações de saúde. Portanto, se qualquer cidadão que tiver um plano particular chegar a uma unidade hospitalar pública, terá que ser atendido, mesmo que a unidade já tenha extrapolado a cota de 25%”.

Sales também demonstra preocupação com a questão da “dupla porta” que esse projeto, uma vez aprovado, pode impor aos hospitais públicos: “seria interessante tentar definir objetivamente como controlar esses 25% porque, indiscutivelmente, é preciso discutir a questão do acesso democrático”. Esse “apartheid” que o PLC 45/10 cria no SUS de São Paulo já foi denunciado pelos sindicatos e associações dos profissionais da saúde em São Paulo desde o início da tramitação desse absurdo projeto. Quem garantirá que, a partir de agora, as OSS (Organizações Sociais) que administram alguns hospitais públicos em São Paulo não vão criar uma dupla fila: uma para pacientes do SUS e outra para usuários de convênios médicos?

A aprovação desse projeto de lei é um grande retrocesso para a saúde pública no Estado de São Paulo. Além de ferir frontalmente o princípio da equidade do SUS, essa lei aprovada pelos tucanos na Assembléia Legislativa sem dúvida alguma irá incorrer em maiores filas nos hospitais públicos (sim, porque eles contarão com 25% de leitos a menos para pacientes do SUS) e aumento no tempo de espera para atendimento. Novamente, o PSDB presta um grande desserviço à população de São Paulo. Não bastassem os abusos cometidos nos pedágios das rodovias paulistas, o tratamento vergonhoso dado pelo governo do Estado ao funcionalismo público, agora os tucanos aprovam uma lei que prejudica uma área tão importante quanto a Saúde Pública. Preocupação com social definitivamente não faz parte da cartilha de gestão tucana!

Confira como votaram os deputados estaduais
Para visualizar os nomes de forma mais nítida, basta clicar sobre a imagem:

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Algumas ponderações sobre o fato do salário médio do Rio ter superado o de SP

O jornalista Paulo Henrique Amorim publicou em seu blog Conversa Afiada na segunda-feira, 20, um texto tratando da questão de que “pela primeira vez, o salário médio do trabalhador do Rio é maior do que o salário médio do trabalhador de São Paulo”, partindo-se de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados na semana passada. A explicação de PHA para esse fato é de que o governo tucano “afundou São Paulo” e que, assim como apontado por um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas), São Paulo vem perdendo participação no bolo da economia brasileira.

Bem, que o governo do PSDB vem promovendo um desmonte do Estado de São Paulo nos últimos 16 anos, isso ninguém duvida. O estado, que alguns anos atrás era conhecido como a “locomotiva do Brasil”, vem registrando taxas de crescimento cada vez mais tímidas na comparação com o total da economia brasileira. Contudo, é preciso tomar muito cuidado antes de sairmos fazendo análises sobre o comportamento de certos indicadores, ao risco de acabarmos dizendo bobagens. No caso dos indicadores econômicos, como o salário médio, por exemplo, mais importante que o componente estático é o componente dinâmico.

Ou seja, é mais importante sabermos a tendência do indicador do que sua posição num dado instante do tempo. Se analisarmos os números do IBGE, veremos que tanto Rio de Janeiro quanto São Paulo registram, até 2009, taxas de crescimento do salário médio muito próximas, conforme pode ser visualizado no gráfico abaixo. Se observarmos a expansão do rendimento médio entre novembro de 2002 e novembro de 2009, veremos que São Paulo apresentou um crescimento médio de 3,1%, enquanto o Rio de Janeiro teve uma elevação ligeiramente menor, de 2,9%. Ambos os estados, contudo, cresceram mais timidamente que a média total do salário médio no Brasil, que foi de 3,9%.

Façamos este mesmo exercício para o período entre novembro de 2002 e novembro deste ano. Neste intervalo de tempo, o salário médio no Rio de Janeiro saltou de R$ 1.392,44 para R$ 1.616,60, um expressivo crescimento de 16,1%. Enquanto isso, o rendimento médio de São Paulo elevou-se de R$ 1.559,63 para R$ 1.611, 80, o que representa um avanço de apenas 3,3%. Deve-se notar que São Paulo manteve praticamente o mesmo ritmo de crescimento que vinha tendo em anos anteriores, com uma ligeira aceleração. Por outro lado, o Rio de Janeiro apresentou um crescimento, a priori, totalmente fora da curva, o que elevou o rendimento médio no estado para um nível superior ao de São Paulo.

Uma observação das curvas mostra claramente que a aceleração do crescimento do rendimento médio do Rio se deu sistematicamente ao longo de 2010. Cabe aqui a questão: esse ritmo de crescimento do salário médio carioca deve se manter nos próximos períodos ou se trata apenas de uma aceleração localizada na série de tempo? Segundo PHA, “o Rio passou a criar empregos que exigem mão-de-obra mais qualificada e, portanto, de salário mais alto. A economia do Rio se beneficia e se beneficiará cada vez mais da industrialização movida a petróleo, pré-sal e Petrobrás. Os salários que o Rio passou a pagar exigem mais estudo e são oriundos da indústria. Como se sabe, a indústria cria mais empregos que o setor de serviços, especialmente os bancos, que aceleradamente trocam homem por computador”.

Salário médio vai manter ritmo de crescimento no RJ?
A explicação do jornalista é bastante plausível, mas carece de fundamentos que indiquem para uma manutenção desta tendência ao longo dos próximos meses e anos. Se novamente recorrermos aos dados do IBGE, poderemos constatar que de fato a indústria no Rio apresentou um comportamento melhor que a indústria paulista com relação a contratação de mão-de-obra ao longo de 2010. Entre janeiro e outubro deste ano, a indústria carioca registrou expansão de 5,5% no nível de ocupação, enquanto a folha de pagamento real cresceu 9,7%. Ou seja, já se descontando a inflação, nota-se um nível de crescimento da folha de pagamento acima da elevação do pessoal ocupado, o que indica contratação de cargos com maiores salários.

Neste mesmo período, o pessoal ocupado na indústria paulista avançou 2,9%, frente a um crescimento de 5,3% na folha de pagamento real. Com isso, a folha de pagamento média real (ou seja, a folha de pagamento real dividida pelo pessoal ocupado) cresceu 3,97% no Rio de Janeiro entre janeiro e outubro deste ano, contra uma elevação de 2,25% em São Paulo em igual período. Naturalmente, como a indústria tem um forte peso na geração de empregos e, portanto, na massa salarial da economia, esse crescimento superior no Rio em comparação à São Paulo pode ser uma explicação para que o salário médio carioca tenha alcançado níveis superiores ao do paulista. A questão que se coloca aqui não é nem a manutenção da tendência, mas sim a manutenção deste ritmo de crescimento.

Isto porque, de fato, as projeções são de que a indústria do Rio de Janeiro deve seguir em trajetória de crescimento nos próximos anos, tanto em função das atividades de exploração, produção e refino do pré-sal quanto pela construção do Pólo Petroquímico do Rio de Janeiro e da dinamização da indústria naval. Mas aí entra uma questão matemática: a expansão dessas indústrias naturalmente irá requerer mão-de-obra especializada, que é logicamente mais cara. Contudo, serão gerados muitos postos também no chamado “chão de fábrica”, com salários tradicionalmente menores. Isso naturalmente segura uma maior expansão da curva de rendimento médio, pois pode implicar em uma expansão do rendimento médio a taxas inferiores ao crescimento do pessoal ocupado.

Logo, teremos que aguardar os próximos meses para verificar se este movimento da curva de rendimento médio do Rio de Janeiro é consistente ou se não passou de uma aceleração pontual devido à maior expansão da indústria naval e petroquímica em 2010. Como dito anteriormente, ainda é cedo para tecer prognósticos: temos que acompanhar a evolução dos indicadores para somente então podermos efetuar uma análise mais certeira. Afinal de contas, como o próprio ditado popular diz: “prudência e canja de galinha não fazem mal a ninguém”.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Desmontando o argumento tucano que tenta justificar privatização de leitos do SUS em SP

A tentativa desesperada dos tucanos para aprovar o PLC (Projeto de Lei Complementar) 45/10, que reserva até 25% dos leitos em hospitais públicos paulistas para pacientes atendidos por planos de saúde, tem promovido um verdadeiro festival de argumentos infundados (para não dizer “besteirol”) por parte dos que defendem esse absurdo projeto. Em linhas gerais, o PSDB alega que a aprovação desse projeto é importante para gerar recursos que serão reaplicados na rede do SUS (Sistema Único de Saúde) de São Paulo, argumentando que isso ajudaria a melhorar as condições de atendimento à população.

Pura conversa fiada. Primeiro, porque como este blog já mostrou anteriormente, a verdadeira razão para a “pressa” tucana em aprovar o PLC 45/10, de autoria do governador Alberto Goldman, é fazer frente ao aumento das despesas correntes da saúde pública paulista, após o ex-governador José Serra (PSDB) promover uma elevação sem precedentes nos gastos públicos da área buscando, com isso, construir uma vitrine eleitoral. Em segundo lugar, a justificativa de que este projeto de lei é necessário para garantir o reembolso ao SUS de despesas com pacientes de planos de saúde é totalmente “furada”, pois já existem leis que tratam desse assunto.

Argumento tucano é totalmente infundado
Ainda assim a bancada do PSDB na Assembléia Legislativa de São Paulo (Alesp) insiste em seguir com esse mesmo argumento. Em seu parecer pela Comissão de Saúde e Higiene da Alesp, por exemplo, o deputado estadual Pedro Tobias – que é médico e como tal deveria ser o primeiro a questionar esse projeto de lei, independentemente do seu partido – justifica a “importância” desse projeto de lei para o SUS paulista com o seguinte exemplo:

Há dados importantes sobre o custeio de uma das unidades de saúde citadas, que demonstram a importância e a oportunidade deste projeto, e que passamos a expor. O Instituto do Câncer do Estado de São Paulo – ICESP, é um hospital OSS ligado à FMUSP-HC – Fundação Faculdade de Medicina – OSS, que atende 100% de pacientes SUS, por força de lei. O orçamento de custeio anual recebido em 2010 (acrescido da previsão de repasse de Novembro/2010 e Dezembro/2010) é de R$ 304 milhões em 2010, em que estão incluídos os R$ 27 milhões de Novembro/2010 e mais R$ 27 milhões em Dezembro/2010.

Atualmente o ICESP presta 34 mil procedimentos e atendimentos por mês, sendo mais de 504 cirurgias por mês, 11 mil consultas médicas por mês, 3,4 mil sessões de quimioterapia por mês, e 2,4 mil sessões de radioterapia por mês, e conta com 240 leitos ativados (dentre 494 leitos totalizados), e 61 consultórios médicos ativos (dentre 124 consultórios médicos totalizados), resultando em aproximadamente 55% a 60% da estrutura ativados. Uma pesquisa realizada no próprio ICESP demonstrou a existência de pacientes portadores de convênios e seguros saúde, na proporção de 18% dos pacientes atendidos como usuários do SUS.

O orçamento de custeio anual solicitado para 2011 está em R$ 387 milhões por ano, chegando a 75% de ativação estrutural global; e para fase completa com 100% de ativação total, estima-se aproximadamente R$ 480 milhões anuais de custeio. Com autorização para destinar pelo menos 20% da capacidade estrutural e de volume de atendimento para o setor de saúde suplementar (particulares, convênios e seguros saúde), estima-se que aproximadamente 50% do orçamento de custeio anual poderia ser obtido por esta fonte
”.

Trocando em miúdos: neste “brilhante” exemplo, o deputado estadual Pedro Tobias diz que atualmente o Instituto do Câncer (IC) de São Paulo opera com cerca de 60% de seus leitos ativados, o que equivale a um custeio anual de R$ 304 milhões (projeção para 2010). Para que a totalidade de leitos (494) fosse ativada, o custeio anual do IC subiria para R$ 480 milhões. Segundo o parecer do tucano, se 20% dos leitos do IC fossem destinados a pacientes de convênios médicos, 50% desse orçamento de custeio – ou R$ 240 milhões – seriam obtidos por essa fonte. Assim, no pensamento matemático do PSDB, a saúde suplementar ocuparia um espaço “mínimo” e presentearia os cofres públicos com 50% do orçamento de custeio.

Contudo, apesar do interessante raciocínio matemático, o nobre deputado Pedro Tobias foi traído pelo seu próprio texto: percebam que ele próprio assinala em seu relatório que “uma pesquisa realizada no próprio ICESP demonstrou a existência de pacientes portadores de convênios e seguros saúde, na proporção de 18% dos pacientes atendidos como usuários do SUS”. Ou seja, de todos os pacientes que são atendidos hoje pelo IC, 18% possuem algum tipo de convênio médico. Lembram-se que alguns parágrafos acima falamos que já existem duas leis que tratam da questão do reembolso ao SUS pelos planos de saúde? Passemos à leitura da Lei Estadual nº 9058, de autoria do então deputado estadual Arlindo Chinaglia (PT):

"Artigo 3º - Nos termos do disposto no artigo 2.º, a assistência gratuita ao indivíduo beneficiário de seguro - saúde ou de outra modalidade assistencial de medicina de grupo, implica o reembolso, ao Poder Público, a ser efetuado pela sociedade seguradora ou entidade congênere, de despesas com o atendimento médico, hospitalar e ambulatorial prestado ao segurado ou beneficiário do seguro.
Parágrafo único - O valor do reembolso de despesas referidas nesse artigo corresponderá ao fixado pelos órgãos federais reguladores do seguro - saúde e das demais modalidade de medicina de grupo.

Artigo 4º - Para o recebimento do valor devido nos termos do artigo 3.º, serão adotados, isolada ou cumulativamente, os seguintes procedimentos, tanto pelas unidades de saúde da rede pública, estadual e municipal, da administração direta, indireta e fundacional, como pelos estabelecimentos do setor privado conveniados ou contratados pelo Estado ou Município:
I - registro, na ficha de atendimento do paciente, da condição de beneficiário de seguro - saúde ou outra modalidade assistencial de medicina de grupo, com os dados que permitam identificar a entidade seguradora;
II - assinatura, pelo paciente ou seu representante, de documento de transmissão, aos Estado ou ao Município, do direito ao reembolso de despesas médico - hospitalares somente pagáveis ao paciente; e
III - assinatura, pelo paciente ou seu representante, de documento comprobatório da assistência médico - hospitalar recebida
".

Ou seja, se essa lei fosse cumprida à risca pelo governo do Estado de São Paulo, as operadoras de planos de saúde reembolsariam os cofres públicos pelo atendimento desses 18% que são conveniados. Se pelas contas do deputado estadual Pedro Tobias, a reserva de 20% dos leitos para convênios médicos geraria uma receita de R$ 240 milhões/ano, então o simples reembolso desses 18% de pacientes conveniados que já são atendidos gratuitamente no IC significaria uma receita de R$ 216 milhões/ano. Para se ter uma noção do que isso significa, basta dizer que corresponde a mais de 70% do orçamento de custeio atual do IC de São Paulo.

O que se vê, dessa maneira, é que não é necessária a aprovação do PLC 45/10 para que sejam efetuados os reembolsos ao SUS por parte dos convênios médicos. Basta apenas que uma Lei Estadual que já existe desde 1994 seja devidamente aplicada, sem a necessidade de se estipular reserva de leitos, uma prática extremamente danosa ao princípio de equidade que rege o SUS. Aqui, cabe a questão: se os tucanos se queixam de falta de recursos para ampliar o potencial de atendimento do SUS, por que então não fazem cumprir a Lei Estadual que já existe? Isso mostra claramente a gestão precária do governo tucano em relação à saúde pública paulista.

Logo, a solução não é fazer reserva de leitos para garantir receita par ao SUS e sim aplicar uma legislação existe há 16 anos, mas que, em função da falta de planejamento do (des)governo tucano, não saiu do papel. Como se vê, esse argumento apregoado aos quatro cantos pelos tucanos não passa de retórica barata e sem fundamento, não justificando, sob nenhum aspecto, a aprovação de um projeto de lei tão danoso para a saúde pública de São Paulo e, ao mesmo tempo, tão estapafúrdio do ponto de vista da gestão pública.