sábado, 29 de janeiro de 2011

Prefeitura de SP não dialoga com população e inviabiliza outra audiência pública do Nova Luz

A insensibilidade e falta de interesse dos governos demo-tucanos no diálogo com movimentos populares são, realmente, espantosas. Isso pode ser constatado facilmente nas ações que tanto a Prefeitura de São Paulo, administrada pelo DEM, quanto o Governo do Estado, do PSDB, tomam quando se deparam com algum tipo de manifestação popular. Recentemente, tratamos aqui nesse blog da ação truculenta da PM de Alckmin contra moradores da Zona Sul de São Paulo, que protestavam contra as enchentes. Mas exemplo dessa truculência é o que não falta. Neste artigo trataremos especificamente da questão da audiência pública do Projeto Nova Luz, que deveria ter sido realizada na noite dessa sexta-feira, 28.

Uma audiência pública nada mais é do que um espaço onde o poder público apresenta determinado projeto e abre a discussão para os movimentos populares e setores da população atingidos por aquele projeto. Ou seja, audiência pública não é palestra ou workshop, onde somente um seleto grupo tem a palavra e o restante apenas ouve. É preciso que haja interação e que os representantes do poder público ali presentes estejam de fato dispostos a ouvir as demandas sociais, esclarecê-las e, na medida do possível, realizar adequações no projeto para contemplar essas demandas. Isso é da cultura democrática brasileira e ações contrárias do poder público nesse caminho evidenciam falta de compromisso do mesmo com a democracia.

Feita essa consideração, passemos a falar do lamentável episódio ocorrido nessa sexta-feira no Centro de Convenções do Anhembi, local onde deveria ter sido realizada a audiência pública do Projeto Nova Luz. Para quem não está interado, o Nova Luz é um projeto urbanístico que propõe a revitalização do polígono urbano que compõe a região conhecida como “Cracolândia”, nas imediações da Estação da Luz. Essa área encontra-se em total estado de degradação, já que durante anos foi praticamente abandonada pelas políticas públicas tanto da Prefeitura quanto do governo do Estado. O projeto em questão propõe, neste sentido, uma restauração dos 45 quarteirões que compõem esse polígono, modificando o aspecto da região e, com isso, atraindo escritórios e novos moradores para região.

Um projeto repleto de falhas
Entretanto, o projeto apresentado pela Prefeitura em novembro do ano passado é restrito a aspectos urbanísticos e, por essa razão, considerado incompleto por muitos urbanistas e pelos movimentos sociais, já que não leva em conta as demandas dos setores que ali vivem. Uma das grandes críticas ao projeto está no fato dele não prever um destino para a população de rua que ali vive e que, além de tudo, é dependente química. Ou seja, a concepção urbanística do projeto é totalmente ultrapassada, uma vez que ignora o aspecto social: reurbanizar uma área, nesta concepção, é tão somente afastar os pobres e marginalizados daquele entorno. É impressionante, por exemplo, que o Projeto Nova Luz não englobe a instalação de clínicas de tratamento para estes viciados no crack.

Além disso, o projeto prevê a desapropriação de 30% dos imóveis dessa região: alguns serão restaurados e outros demolidos, para dar lugar a estacionamentos e edifícios que devem funcionar como centros comerciais. Naturalmente, a população mais pobre que reside nesta região será a mais impactada, pois terá seu imóvel desapropriado e terá que se mudar dali, para outro ponto da cidade. Além disso, essa desapropriação atinge em cheio os comerciantes da Rua Santa Ifigênia, popular rua de comércio de eletro-eletrônicos em São Paulo. Os comerciantes vêm reclamando sistematicamente que a Prefeitura não atende suas reivindicações e não lhes dá garantias de que eles terão a preferência para retornarem aos imóveis depois de concluído o projeto.

A existência de todos esses impasses revela o quão importante é a realização de uma audiência pública que aglutine as partes interessadas para solucionar essa questão. Afinal de contas, a Prefeitura não pode simplesmente ignorar essas demandas – mais do que legítimas – e tocar um projeto tão cheio de problemas como o Nova Luz. Após duas apresentações do projeto – uma em novembro e outra em dezembro – o Secretário de Desenvolvimento Urbano da Prefeitura de São Paulo, Miguel Bucalem, marcou uma audiência pública para o último dia 14 de janeiro. Contudo, essa audiência foi desmarcada, sob o pretexto na ocasião de que a Prefeitura não esperava o comparecimento de tantas pessoas e, como o local marcado (auditório da Fatec) era muito pequeno, o melhor seria remarcar essa audiência.

Prefeitura ignora diálogo em audiências públicas
Pois bem, isso foi feito. A audiência pública, prevista para acontecer no dia 14, foi remanejada para essa sexta-feira, 28, agora num lugar maior, o Centro de Convenções do Anhembi, que comporta mais de 2 mil pessoas. Segundo informações da PM, antes mesmo de começar a audiência, já havia cerca de 1000 pessoas no auditório do Anhembi e, por volta, das 18 horas mais pessoas começaram a chegar junto a uma caminhada organizada pelos comerciantes da Luz, que saíram da Santa Ifigênia e foram em direção ao Anhembi. Quando a organização da audiência pública viu que novamente o público seria elevado, a tropa de choque da Polícia Militar foi posicionada em frente ao palco, conforme relato do Vereador Donato (PT) pelo Twitter. Uma atitude extremamente insensata dos organizadores, já que instaurou um clima de tensão no ar.

Mais que isso: quando os representantes da Prefeitura dão ordem para a tropa de choque ficar dentro do auditório, posicionada em frente ao palco, eles dão claros sinais que não topam o diálogo aberto com a população. Afinal de contas, aquelas pessoas estavam ali para serem ouvidas, para terem garantias de que o poder público iria atender às suas demandas. Mas novamente a Prefeitura se mostrou indisposta ao diálogo com esses setores. Ao invés de um diálogo, o que se viu nos primeiros minutos foi um monólogo, com o projeto sendo novamente apresentado (como se a população já não o conhecesse bem). O tumulto foi inevitável, já que a população estava ali para ser ouvida e não apenas para ouvir, e novamente se assistiu a uma reação truculenta da PM.

Novamente, a audiência foi inviabilizada, já que com o tumulto e com a postura extremamente anti-democrática dos representantes da Prefeitura, a população ali presente se dispersou e o auditório se esvaziou em questão de minutos. O Secretário Miguel Bucalem, para fazer jogo de cena, ainda chamou alguns representantes dos movimentos populares no palco, mas poucos foram falar. Já não havia mais clima para se fazer audiência pública. E que seja ressaltado: não havia clima porque mais uma vez a Prefeitura de São Paulo agiu de forma autoritária e totalmente anti-democrática. A audiência, que deveria ter sido um espaço aberto para discussão, se transformou no palco de um novo tumulto. Bucalem, por sua vez, declarou que deu a audiência como realizada, o que só confirma a incapacidade de diálogo da gestão Kassab com os movimentos populares.

Estão previstas ainda mais duas audiências públicas do Projeto Nova Luz, com datas que ainda não foram estabelecidas. Contudo, este blog defende que essas audiências sejam realizadas de forma totalmente distinta dessas tentativas fracassadas que ocorreram no mês de janeiro. A Prefeitura tem que ouvir os moradores e comerciantes da região e fazer as adequações necessárias no Projeto. É impensável tocar um projeto cuja missão é revitalizar uma área urbana sem ouvir a população atingida pelas adequações urbanísticas. A gestão Kassab novamente deixa claro que faz política urbana apenas para grandes grupos empresariais, esquecendo-se que aquelas regiões são formadas não somente por prédios ou casas, mas, sobretudo, por pessoas.

Leia também
As contradições do Projeto Nova Luz: para onde Kassab vai mandar a população pobre da região?

4 comentários:

  1. Muito bom post, eu estava lá e Tmb achei absurdo a mesa ignorAr e dar como dada a audiência. Essa lei esta toda errada. Após muito estudo, achamos uma forma de frear essa lei que vende são paulo inteira. Vamos atacar na lei mar 14917/09, é a lei que vende são Paulo.

    www.peticaopublica.com.br/?pi=P2011N6122

    Por favor ajudem a repassar essa lei da concessão urbanística vende são paulo inteira.

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  2. Toni,

    Obrigado pela sugestão! Vou dar uma olhada nessa lei e divulgar!

    Forte abraço!

    Leandro

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  3. Olá Leandro, te indico a Leitura do comentario 100% fundamentado do Jurista Famoso Kyoshi Harada

    vale apena a leitura:
    http://jusvi.com/artigos/38583

    "Tudo fica por conta do “concessionário”, que investirá seu capital nesse negócio de desapropriar, construir e revender as unidades não destinadas ao uso especial pela administração pública. O concessionário poderá, ainda, vender ou locar espaços não caracterizados como sendo de uso comum do povo ou de uso especial, assim como promover a incorporação imobiliária. Em resumo, o concessionário terá direito a um determinado feudo dentro de uma cidade do século XXI"

    Se puder nos ajudar na divulgação, precisamos de mais apoios.

    obrigado

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  4. Vale ver um post deste, claro e sem interesses politicos.

    Parabens

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