domingo, 26 de dezembro de 2010

Em nome das Olimpíadas, Prefeitura do Rio faz remoção truculenta de comunidades pobres

São inegáveis os ganhos tanto do ponto de vista da economia quanto da remodelagem do espaço urbano advindos da realização das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro. Sem dúvida, ao lado da Copa do Mundo de 2014, as Olimpíadas provocarão um grande aquecimento na economia carioca, em função da geração de milhares de empregos diretos e indiretos, aumento do fluxo de turistas para o Rio, crescimento das vendas do comércio e expansão do setor de construção civil. Além disso, o plano de mobilidade urbana feito para suprir a demanda tanto da Copa quanto dos jogos olímpicos deve criar uma estrutura de transportes que beneficiará muito a população do terceiro maior estado brasileiro.

Não obstante a todos esses benefícios, é impossível deixar de tratarmos de uma questão que tem se constituído em um verdadeiro problema para moradores da Zona Oeste do Rio, região que abrigará a maior parte da estrutura dos jogos olímpicos de 2016. De acordo com denúncias de moradores de comunidades da região, como a Vila Recreio II, a Vila Harmonia, a Restinga, a Vila Autódromo, dentre algumas outras, a Prefeitura do Rio tem promovido, desde meados de dezembro, remoções da forma mais arbitrária possível da população que mora nessas áreas. Segundo esses moradores, retroescavadeiras têm promovido um verdadeiro show de horrores, derrubando casas com pertences dos moradores dentro enquanto estes saem para trabalhar.

Remoção brutal dos moradores pela Prefeitura
Esse quadro é muito grave, pois a realização dos jogos, que deveria ser um bom motivo para melhorar as condições de vida desses moradores através da melhoria dos serviços prestados pelo poder público, vem sendo motivo para que a Prefeitura, ao contrário, aja da forma mais truculenta possível e desrespeite frontalmente o direito de moradia de milhares de pessoas. Em novembro, a Secretaria de Movimentos Populares do PT-RJ e as setoriais de moradia e reforma urbana do PT publicaram uma nota de repúdio a esse tipo de ação por parte da Prefeitura do Rio. Nesta semana, a urbanista e relatoria especial da ONU (Organização das Nações Unidas) para o direito à moradia adequada, Raquel Rolnik, descreveu da seguinte maneira as barbaridades que têm sido promovidas pela Prefeitura na Zona Oeste do Rio:

Sem qualquer negociação ou abertura ao diálogo, equipes da subprefeitura da Barra da Tijuca incluindo 40 homens da Guarda Municipal começaram uma operação de remoções sumárias e demolições de lares e pontos comerciais na área para a construção do Transoeste: um corredor de ônibus padrão BRT que fará a ligação da Zona Sul à Barra, região que concentrará a maioria das instalações e modalidades olímpicas em 2016.

Segundo denúncias, retro escavadeiras da empreiteira que constrói o corredor estariam derrubando casas com mobílias e pertences dentro. Durante o dia 15, alguns moradores alegam que tiveram suas casas derrubadas enquanto estavam fora trabalhando e outros que receberam um prazo até meia noite daquele dia para se retirarem e darem espaço às máquinas.

Uma equipe do Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro conseguiu, em caráter emergencial, uma liminar que suspendia as remoções forçadas, pois os oficiais da subprefeitura agiam sem ordem judicial de despejo ou intimação. Entretanto o pesadelo para os moradores dessas três comunidades da zona oeste carioca não terminou, já que a liminar da justiça não era válida a todos os imóveis
”.

A ocorrência desse tipo de prática nessa altura do ano não é de surpreender. Como bem se sabe, o mês de dezembro é marcado por uma maior dispersão e desmobilização dos movimentos sociais e até mesmo dos partidos políticos, em função das festas de final de ano. Essa “tradição” tem sido aproveitada pela Prefeitura do Rio para promover essas remoções “na calada do dia”, enquanto os moradores trabalham, sem encontrar qualquer tipo de resistência ou manifestação dos movimentos de moradia e de direitos humanos. Isso só torna a postura da Prefeitura ainda mais grave, pois além de promover remoções sem o menor diálogo com a população atingida, ainda o faz em um momento que essas pessoas estão desmobilizadas.

Prefeitura do Rio tem que mudar de atitude
É claro que as obras para as Olimpíadas são mais que necessárias. Isso todos concordam. O que não pode acontecer é que essas obras sirvam de pretexto para o poder público remover dessas regiões famílias que ali estão estabelecidas há décadas, que têm uma história com aquela região. Pior ainda é a forma com que têm sido feitas essas remoções. Se remover essas famílias já nos parece um tanto equivocado, quanto mais remover usando de brutalidade, promovendo uma verdadeira barbárie contra o direito fundamental de moradia e fazendo tudo isso à revelia da lei. Sim, porque de acordo com as denúncias dos moradores, a Subprefeitura da Barra da Tijuca e a empreiteira responsável pela obra não têm mandados judiciais para realizar essas desocupações.

E é impossível vermos toda essa arbitrariedade e truculência da Prefeitura em relação a essas comunidades sem levantarmos a questão relacionada às condições sócio-econômicas. Será que a Prefeitura do Rio agiria dessa mesma maneira se no traçado de suas obras estivesse um condomínio de luxo? Com certeza, não. Até mesmo porque, nesse caso, tudo seria acompanhado muito de perto pela imprensa e o fato seria amplamente explorado. Contudo, como se tratam de trabalhadores, pessoas pobres, a Prefeitura passa por cima da legalidade, não estabelece diálogo com essas comunidades e fere o direito de moradia de milhares de cidadãos. Tudo isso sem que a Rede Globo, que fica ali ao lado, em Jacarepaguá, se digne a destinar um mísero minuto em seus telejornais para denunciar essa grave situação.

É inadmissível que o Prefeito Eduardo Paes (PMDB) dê continuidade a esse show de horrores que tem sido promovido nas comunidades da Zona Oeste do Rio. Sem dúvida alguma, essa população é a mais interessada na realização dos jogos olímpicos, pois estes são uma oportunidade real de melhoria das condições de vida dessas pessoas. O que não se pode é transformar algo que seria para beneficiar o cidadão em um fato que fere os seus direitos e a sua dignidade. E é preciso também que o Secretário de Habitação do Rio, Jorge Bittar (PT), trabalhe com todas suas forças para evitar esse tipo de truculência do poder público para com os moradores dessas comunidades. Afinal de contas, a justiça social é o ponto central que tem pautado toda intervenção do Partido dos Trabalhadores na sociedade brasileira nesses 30 anos de existência.

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