sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Para maioria dos brasileiros, partidos políticos e Congresso não são indispensáveis à democracia

A divulgação do Latinobarômetro, pesquisa feita anualmente com mais de 20 mil entrevistas em 18 países da América Latina, trouxe resultados muito satisfatórios no que se refere à percepção da democracia na região. De uma maneira geral, pode-se dizer que a democracia atinge nos países latino-americanos o seu melhor momento em 15 anos de pesquisa. Ao mesmo tempo em que se constatou essa melhora generalizada, vericaram-se também algumas incongruências no que diz respeito à percepção da população de alguns países sobre o que é democracia – e o Brasil é um desses países.

Sobre a percepção da democracia no continente e no Brasil especificamente, vale a pena destacar os resultados de alguns indicadores medidos pelo Latinobarômetro. No indicador geral – denominado “apoio à democracia” – apurou-se que 61% dos entrevistados em toda a América Latina afirmaram que “a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo”. Venezuela (84%), Uruguai (75%) e Costa Rica (72%) são os três países que lideram esse ranking de apoio à democracia. O Brasil aparece bem mais abaixo na lista de países – aqui, apenas 54% dos entrevistados declararam ser a democracia preferível a outras formas de governo. O desempenho do país melhora quando se avalia o indicador “churchilliano”.

Neste indicador, os entrevistados têm que se posicionar com relação à frase atribuída ao ex-primeiro ministro britânico, Winston Churchill, de que “a democracia pode ter problemas, mas é a melhor forma de governo”. De acordo com o Latinobarômetro, 77% dos entrevistados em toda América Latina estão concordam com essa afirmação – no Brasil este percentual sobe para 81%. Percebe-se, aqui, o quanto o conceito de democracia ainda é difuso para os brasileiros: vale dizer que dentre os 18 países pesquisados, o Brasil foi o que apresentou maior diferença no indicador “apoio à democracia” e “democracia churchilliana” – 27 pontos percentuais (54% a 81%).

Congresso e partidos não são indispensáveis
Alguns indicadores específicos, por sua vez, ratificam o quanto o conceito de democracia ainda não é suficientemente maduro no Brasil. Chama especial atenção o indicador denominado “legitimidade do Congresso”. Este indicador foi auferido com base em uma questão feita aos entrevistados: “há quem diga que sem Congresso Nacional não pode haver democracia, mas há outras pessoas que dizem que a democracia pode funcionar sem o Congresso Nacional. Qual dessas frases está mais próxima da sua maneira de pensar?”. Em toda a região, 59% afirmaram que sem Congresso não pode haver democracia.

No caso do Brasil, contudo, o percentual que afirmou que sem Congresso Nacional não pode haver democracia foi de apenas 43%, o segundo pior desempenho entre todos os países da região, ficando atrás apenas do Equador (onde 40% têm essa opinião). Esse indicador mostra o quanto o Congresso Nacional está desacreditado no Brasil e reforça a urgência de uma ampla reforma política no Brasil. Afinal de contas, são percepões como esta entre a população que reforçam o processo de judicialização da política, que temos visto recentemente no Brasil. Para saber mais sobre esse processo de judicialização da política, clique aqui.

Outro indicador que chama bastante atenção é o de “legitimidade dos partidos políticos”. Semelhantemente à questão feita sobre o Congresso Nacional, neste caso os entrevistados tinham que se posicionar a respeito das afirmações: “há quem diga que sem partidos políticos não pode haver democracia, e outros que dizem que a democracia pode funcionar sem partidos políticos. Qual frase está mais próxima da sua maneira de pensar?”. Aqui, 59% dos entrevistados em toda América Latina afirmaram que “sem partidos políticos não pode existir democracia” – no Brasil este índice caiu para apenas 44%.

No Brasil, 49% estão satisfeitos com democracia
Considerando estas respostas, o Latinobarômetro produziu um índice de “legitimidade da democracia”, agrupando a percepção dos entrevistados em alta, média e baixa legitimidade. De acordo com os resultados, para 22% da região a democracia tem uma baixa legitimidade (ou seja, nem partidos políticos nem Congresso são indispensáveis), para 46% a democracia tem uma legitimidade média e para 32% tem uma alta legitimidade. Assim, a diferença do percentual de pessoas para quem a democracia tem alta legitimidade e aquelas para as quais a democracia tem baixa legitimidade é de 10 pontos percentuais, na média regional.

No caso específico do Brasil, para 32% dos entrevistados a democracia tem baixa legitimidade, enquanto que para 47% tem legitimidade média e para 21% tem alta legitimidade. Muito próximo do Brasil está o México: segundo o Latinobarômetro, para 31% dos mexicanos a democracia tem baixa legitimidade, para 49% tem legimitidade média e para 21% alta legitimidade. Essa dispersão dos diversos indicadores relacionados à percepção do brasileiro sobre democracia chamou atenção do próprio Latinobarômetro, especialmente quando confrontou-se esse indicador de “legitimidade da democracia” com o “indicador churchilliano”, mencionado anteriormente.

No que diz respeito à “satisfação com a democracia”, 44% dos latino-americanos afirmaram estarem satisfeitos ou muito satisfeitos com a democracia – índice que sobe para 49% no caso do Brasil. É interessante notar que no caso do nosso país, o índice de satisfação com a democracia encontra-se bastante próximo do índice de satisfação com economia, 47%. A média do indicador de satisfação com a economia em todos os países da América Latina é de 30%, segundo o Latinobarômetro. Assim, uma questão que pode ser levantada aqui é até que ponto o índice de satisfação com a democracia, no caso brasileiro, não está colado ao índice de satisfação com a economia.

Afinal de contas, é pertinente pensarmos que a satisfação do brasileiro com a economia pode “contaminar” sua avaliação sobre a democracia. De qualquer forma, os dados, apesar de trazerem revelações muito boas, também trazem outra que mostram que o Brasil ainda tem muito a avançar no que diz respeito à consolidação da democracia. O conceito de democracia, mostram os dados, ainda não é suficientemente maduro no nosso país – haja vista o elevado percentual de brasileiros que declararam que é possível ter democracia sem Congresso Nacional e sem partidos políticos. Certamente, é um importante indício que reforça a urgência da Reforma Política em nosso país.

2 comentários:

  1. Leandro,eu particularmente prefiro a democracia,mas em relação ao congresso nacional eu o vejo com desconfiança.O congresso nacional tem um grande número de políticos que na sua maioria estão mais preocupados com seus interesses pessoais do que em trabalhar em prol da sociedade.Penso que a fiscalização e a cobrança do povo são mais importantes para a democracia,do que um congresso nacional com número excedente de representantes e que ganham um salário astrônomico as custas do povo.Para resolver esse problema penso que e essencial que o governo faça bons investimentos na educação da população,porque assim o povo vai ter mais conhecimento para poder participar e atuar de forma ativa nas questões políticas.O congresso tem uma função importante na sociedade,mas seus representante atualmente se mostram mais preocupados em aprovar leis que lhes favoreçam do que em trabalhar em prol da população.Espero que isso mude com a reforma política.
    Abraços!

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  2. Olá Alan,

    O Congresso tem uma função importantíssima, de forma que ao meu ver é impossível falar de democracia sem ele. Afinal de contas, o Congresso nada mais é do que a expressão da representação popular!

    Naturalmente vc encontra imperfeições no funcionamento do Congresso e são essas imperfeições que acabam fazendo com que muitas pessoas desacreditem do Legislativo. Gosto muito de uma frase do deputado federal José Genoino, onde ele diz que "o escândalo está para a política assim como a doença está para a saúde".

    E é bem por aí mesmo. Quando vc tem o escândalo, é preciso que ele seja apurado e, se confirmado, punido! Isso, contudo, não significa que o Congresso não é importante! A reforma política é essencial justamente pra isso - para que seja feito esse enfrentamento e para que fique mais clara a relação partido-candidato-eleitor.

    Atualmente, a reforma política é, sem duvida, nossa maior urgência. Somente ela pode recuperar a credibilidade perdida por nossas instituições.

    Obrigado pelo comentário,

    Forte abraço!

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