sábado, 25 de dezembro de 2010

Estadão municipaliza surto recorde de dengue em SP para isentar de culpa governo tucano

O esforço do Estadão para tentar dissociar o surto recorde de dengue em São Paulo neste ano da irresponsabilidade do governo tucano beira o ridículo. Em editorial publicado neste sábado, 25, o jornal poupa críticas ao governo do Estado e as concentra na “falta de ações dos governos locais” para impedir que os casos de dengue avançassem na absurda proporção desse ano. De certa maneira, podemos dizer que o Estadão tentou descaradamente “municipalizar” a dengue, escondendo os graves erros do governo tucano na execução de políticas públicas para evitar o surto da doença, como pode se visto no seguinte trecho do editorial:

Em 2010 a doença voltou a ameaçar seriamente o País e mesmo em São Paulo, o mais rico Estado da federação, o número de casos quadruplicou já em janeiro. Nos últimos três anos, o governo estadual investiu R$ 120 milhões no combate à dengue e megaoperações são organizadas sempre que aumenta o número de casos. Passado o perigo, há uma acomodação dos governos locais. Por causa da falta de continuidade no combate à doença, ela não demora a voltar.

Há pouco mais de um mês, levantamento da Secretaria de Estado da Saúde mostrou que a Baixada Santista voltou a ser recordista em número de casos de morte pela doença - das 120 vítimas registradas em São Paulo até então, 81 eram de cidades litorâneas. A região reunia 20% do total de casos de dengue no Estado
”.

Casos de dengue crescem 2000% em SP
A tentativa do editorial em deslocar a responsabilidade pelo crescimento da dengue em São Paulo do governo do Estado para os municípios é, no mínimo, esdrúxula. Para se ter uma idéia da expansão apocalíptica dos casos de dengue no estado, basta dizermos que eles cresceram nada menos que 2000%, passando de 9.710 ocorrências em 2009 para mais que 201 mil casos somente entre janeiro e outubro deste ano. Como a situação tende a piorar no final do ano, por conta da chegada do verão e do aumento das chuvas, esse número deve encerrar 2010 em patamar ainda mais expressivo.

Até este ano o recorde da dengue em São Paulo havia sido registrado em 2007, quando os casos em todo o estado atingiram 92,3 mil. Ou seja, o número de casos de dengue registrado nos dez primeiros meses de 2010 já é mais que o dobro do recorde anterior verificado no Estado, o que mostra claramente o descaso do poder público com o avanço da doença. Em algumas regiões do Estado, sobretudo no interior, a situação é mais que preocupante. Para medir a situação de alerta, os profissionais da saúde e responsáveis pelas políticas públicas usam o chamado Índice Rápido de Infestação do Aedes Aegypti (LIRAa), que quando atinge valores superiores a 1 já indica risco elevado de transmissão.

Em Ribeirão Preto, por exemplo, o LIRAa já atingiu 1,8 em novembro deste ano, revelando um quadro crítico da proliferação da doença naquela cidade. No litoral a situação não é menos dramática: em São Sebastião o índice já atinge 1,6. Esse quadro alarmante reflete, sobretudo, a irresponsabilidade do governo do Estado nesses últimos anos em relação a políticas de saúde pública para conter esse surto. Em primeiro lugar, o governo do PSDB se omitiu totalmente em relação à doença ao transferir para as prefeituras a responsabilidade pela execução de ações preventivas contra a dengue.

Em 2008, quando a dengue perdeu força no Estado, a gestão Serra reduziu substancialmente os recursos investidos para o combate à doença e prevenção contra uma nova epidemia. Naquele ano, nada menos que 2,2 milhões de pessoas deixaram de ser atendidas com visitas e trabalhos de controle de proliferação. Esse número representa 35% da meta que o próprio governo do Estado traçou para 2008 em seu Plano Plurianual (PPA) 2008-2011. Ou seja, bastou que o surto de dengue arrefecesse um pouco para o então governador José Serra (PSDB) afrouxar também as políticas de combate, cumprindo apenas 65% da meta de famílias visitadas.

Vale destacar que o governo tucano também não cumpriu, naquele ano, a meta de treinamento de pessoal para orientar a população contra a dengue, tendo sido treinados apenas 6 mil pessoas, o que representa dois terços da meta de 9 mil estipulada no PPA. Isso mostra a total irresponsabilidade do governo tucano em relação à execução de políticas públicas já estabelecidas no Plano Plurianual do Estado para impedir novos surtos de dengue. E o resultado dessa irresponsabilidade é este que vemos agora: uma explosão de mais de 2000% nos casos de dengue neste ano. Tentar culpar as prefeituras é ridículo, uma vez que políticas de prevenção e combate à dengue constam no PPA como responsabilidade do governo do Estado.

Terceirização da saúde torna atendimento precário
Agora, em uma parte de editorial, o Estadão acertou, ainda que não tenha esclarecido melhor a questão. É exatamente o trecho que se refere ao despreparo dos profissionais da saúde para o enfrentamento da questão, como pode se ver abaixo:

Tão preocupante quanto a explosão de casos é o despreparo dos profissionais da rede de saúde pública para o atendimento aos pacientes. Em Santos, 70% das pessoas contaminadas que perderam a vida só tiveram a doença diagnosticada
depois de passar por mais de um local de atendimento, ou então não receberam, no primeiro atendimento, o tratamento adequado.

Como sempre alertaram os sanitaristas, dengue não se combate apenas com o conhecido fumacê, os mutirões de limpeza nas periferias ou as advertências dos agentes de saúde às donas de casa que teimam em deixar água parada nos vasos de plantas. Um programa eficiente de combate à dengue tem de prever medidas que vão da vigilância permanente para evitar a formação de criadouros até a melhor qualificação das equipes de Saúde
”.
De fato, o estado de São Paulo vive mesmo um problema de atendimento precário por parte dos profissionais da saúde. O interessante é que esse problema começou a crescer à medida que os hospitais públicos de São Paulo começaram a ser administrados pelas chamadas OSs (Organizações Sociais de Saúde). Para se ter uma idéia, em algumas regiões do estado, como o ABC paulista, 90% dos funcionários da saúde são terceirizados, de acordo com dados do SindSaúde. Dos 2,3 mil profissionais de saúde que prestam atendimento na área, apenas 230 são contratados diretamente pelo Estado: todo o restante presta serviço às OSs.

Logo, se a precarização do serviço prestado pelos profissionais de saúde amplia-se na mesma proporção em que hospitais são transferidos para administração das OSs, só pode se chegar à conclusão de que é exatamente essa terceirização da saúde pública do estado de São Paulo que tem reduzido a qualidade do serviço prestado aos pacientes. Como não é novidade para ninguém que na cartilha tucana o que interessa é apenas custo e não qualidade nos serviços prestados à população, não causa admiração esse tipo de postura do governo de São Paulo. Não adianta os grandes jornalões quererem transferir a responsabilidade do caos para os municípios, já que os dados são muito claros ao mostrarem que o governo tucano não cumpriu com suas próprias metas.

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