sábado, 18 de dezembro de 2010

Mercadante expõe seus planos para C&T e avalia desafios da área no governo Dilma

É praticamente consensual entre os analistas a necessidade do Brasil continuar ampliando os investimentos em C&T (Ciência e Tecnologia) ao longo dos próximos anos, sendo esta elevação um fator crucial para o desenvolvimento de longo prazo do país. O investimento em C&T possibilita à economia expandir suas fronteiras de possibilidades de produção com ganhos de competitividade, especialmente no que diz respeito ao chamado P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) incremental, que busca justamente desenvolver melhorias tecnológicas para aprimorar determinados processos produtivos.

Pensando o Brasil como um país que caminha cada vez mais para ser a 5ª maior economia do mundo já na próxima década, que começa em 2011, podemos entender o quão importante é o desenvolvimento de políticas públicas no setor de C&T nos próximos anos, aprofundando os avanços obtidos ao longo do governo Lula. Neste sentido, o Boteko reproduz abaixo uma entrevista concedida pelo futuro ministro da Ciência e Tecnologia, Aloísio Mercadante (PT-SP), ao Portal da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) na última sexta-feira. Mercadante teve seu nome confirmado para o MCT nessa semana pela Presidente eleita Dilma Rousseff.

Na entrevista, o futuro ministro destaca os avanços conquistados no setor ao longo dos oito anos de governo Lula e aponta também os desafios para o próximo período. Mercadante citou, no trecho final da entrevista, a idéia de transformar a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), atualmente uma empresa pública, em um banco para financiamento de projetos tecnológicos. Nas próprias palavras do futuro ministro, seria uma espécie de “BNDES da indústria”, o que, se confirmado, será um grande ganho para o setor de C&T nacional, uma vez que ao se converter em banco, a Finep sai das restrições orçamentárias que a circunscrevem. Confira a íntegra da entrevista reproduzida abaixo pelo Boteko:

Portal da Unicamp - A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e Academia Brasileira de Ciências (ABC) divulgaram nota no dia 2 de dezembro manifestando a expectativa quanto à manutenção, pelo novo governo, das condições para que o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) conduza uma efetiva política de Estado. Como novo ministro indicado para a pasta, que resposta o senhor daria às duas principais entidades representativas da comunidade científica brasileira?

Aloizio Mercadante – Nós tivemos uma política extremamente exitosa e eficiente, tanto do ponto de vista do avanço na educação pública, com a expansão das universidades federais e programas que expandiram a estrutura de ensino e pesquisa, quanto no Ministério de Ciência e Tecnologia, com o sistema de pós-graduação, investimentos na excelência, descontingenciamento dos Fundos Setoriais, um adensamento da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que não teve o mesmo crescimento da receita da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), mas foi fortalecido inclusive através dos Fundos Setoriais, e a definição de estratégias, sobretudo o desafio da inovação, juntar pesquisa e desenvolvimento no processo produtivo.

Então há, de fato, um reconhecimento dessa política e nós vamos evidentemente dar continuidade e fazer os ajustes necessários. Tive uma reunião essa semana com integrantes da SBPC e da ABC, exatamente discutindo os temas mais sensíveis e os desafios que temos pela frente. Aqui mesmo, na Unicamp, hoje, colhi uma série de demandas muito concretas, como problemas como acesso a importação de produtos, que é muito lento em razão da burocracia. Para pesquisa esse tempo é absolutamente precioso e você dificulta muito. São questões pontuais, que vão desde a compra de periódicos, até às grandes diretrizes, que precisamos aperfeiçoar no Plano Nacional de Ciência e Tecnologia (PAC da Ciência), para darmos conta desse imenso desafio que é a inovação tecnológica no Brasil.

Portal - O PAC da Ciência, lançado em 2007 na gestão do ministro Sergio Rezende, propiciou um aumento dos recursos financeiros federais para CT&I e ampliou políticas e programas para o desenvolvimento científico e tecnológico do país. Essa política será mantida?

Mercadante – Nós fizemos um programa de 2007 a 2010, de R$ 41,5 bilhões, que foi integralmente cumprido. Estamos agora elaborando o Plano 2, que vai restabelecer metas, definir novos focos, fortalecer instrumentos. Pretendemos ampliar. A própria presidente eleita (Dilma Rousseff) sinalizou com a perspectiva de ampliarmos a participação da C&T no PIB brasileiro.

Portal - Desde a criação do MCT, em 1985, os diversos governos têm prometido elevar os investimentos em C&T para 2% do PIB, mas até agora essa expectativa não se confirmou. Essa meta finalmente será alcançada na sua gestão?

Mercadante – Vamos aguardar a posse. Vamos ter metas e vamos lutar para poder aumentar a participação. Esse é um grande desafio, é algo necessário. Evidente que há demandas da saúde, da educação, demandas dos investimentos públicos de uma forma geral. O Brasil ficou muito tempo com sua capacidade fiscal comprometida pelo baixo crescimento, pela dívida pública e pelos juros. O atual ambiente macroeconômico de um crescimento acelerado e sustentável melhorou a capacidade de investimento, mas ela ainda é muito baixa. As estatais, por exemplo, representam 64% do investimento público federal. Então, nós temos ainda um problema macroeconômico a ser equacionado.

Ao mesmo tempo, a C&T é decisiva para que possamos crescer com qualidade, com inovação, gerar mais valor agregado, melhorando as contas externas do País. Portanto, é um investimento estratégico para o Brasil. Por isso acho que temos condições de melhorar a posição do Ministério. Já é (o MCT) o sétimo ministério na Esplanada em termos de orçamento, cresceu muito nesse governo e nós precisamos continuar avançando para atender aos desafios da sociedade do conhecimento, que é o desafio do futuro e o principal desafio do Brasil.

Portal - Relatório da Unesco divulgado recentemente aponta uma participação maior dos países emergentes, entre eles o Brasil, no mapa da P&D mundial. Mesmo assim, a distância em relação aos países desenvolvidos ainda é grande. Em sua opinião, no caso brasileiro, quais os principais gargalos?

Mercadante – Somos hoje o 13º país no ranking internacional de publicações científicas indexadas, o que é um resultado espetacular. Se você olhar algumas disciplinas, como matemática, física e engenharias, nós estamos acima dos Brics (Brasil, Rússia, China e India) em qualidade das publicações. Não em volume, onde estamos bem abaixo da China e Índia, mas na qualidade das citações estamos acima da média. Agora, quando vamos para a inovação, por exemplo patentes, o Brasil está muito abaixo do seu potencial. Em algumas áreas, como biomédicas, muito abaixo dos nossos desafios. Então precisamos ter um foco muito especial para essas áreas e sair de uma visão ofertista, que é a visão do passado, quando você tinha o sistema de pós-graduação e de pesquisa e as empresas faziam demandas pontuais. Isso não funciona, não é mais assim no mundo.

Temos de ter uma política de compras. Aprovamos a Medida Provisória 495, que dá poderes ao Estado para comprar, inclusive produtos nacionais, com até 25% acima do preço, desde que tenha impacto na inovação. Nós precisamos criar uma interação entre todos os agentes da cadeia produtiva. Universidades, governo, empresários. Criar uma cultura de inovação empresarial. Temos um grande desafio e para a superação desse desafio nós temos algumas experiências no Brasil muito exitosas. Chamo atenção para o caso da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). Somos hoje o segundo país produtor de alimentos no mundo, aumentamos em 51% a produção agrícola no governo Lula, e a Embrapa teve um papel absolutamente decisivo.

Temos os exemplos do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) e do CTA (Centro Técnico Aeroespacial) na relação com a Embraer, que é a única empresa de aviação líder no seu segmento entre os países abaixo do Equador. E temos o exemplo do Cenpes (Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello) da Petrobrás, com toda a inovação na cadeia de gás e petróleo. Então, o Brasil tem capacidade e experiências exitosas para implantar uma visão sistêmica da inovação, que é o que nós vamos buscar aprofundar nesse próximo período.

Portal - A Lei de Inovação e a Lei do Bem, que representaram dispositivos importantes, não foram suficientes para criar essa cultura de inovação no Brasil?

Mercadante – Ajudaram muito. A Lei de Inovação e a Lei do Bem deram incentivos fiscais, subsídios, aumentamos extraordinariamente os recursos para esses segmentos, estamos tendo grandes empresas internacionais que estão vindo investir em C&T no Brasil. A GE (General Eletric), por exemplo, está fazendo um centro estratégico, a Vale fez um grande projeto no Pólo Tecnológico de São José dos Campos. Então nós estamos conseguindo atrair investimentos e estamos expandindo. Mas é um desafio fundamental porque isso é absolutamente decisivo para a economia do futuro, que vai ser uma economia da Ciência e da Tecnologia, uma economia da informação, uma economia do conhecimento.

Portal - Outro dado apontado pela Unesco é a estagnação na formação de novos doutores no Brasil, que caiu nos últimos cinco anos de 15% para 5% ao ano. Como reverter essa tendência? O novo governo pretende, por exemplo, rever a política de bolsas do CNPq?

Mercadante – Nós tivemos esse ano 155 mil bolsas CNPq e Capes. É um esforço muito grande. A Capes triplicou o seu orçamento, o CNPq não. Então tem de ter uma política especial para o CNPq e já apresentei a minha preocupação ao governo. Nós precisamos também que a Finep se transforme numa instituição financeira, porque ela vai ter muito mais atividades para o financiamento e sai das restrições orçamentárias, a exemplo do que é o BNDES na área da indústria. Nós precisamos mexer na política de financiamento à pesquisa. Agora, com a criação de novas universidades federais está havendo uma descentralização importante na formação de mestres e doutores, criando-se novos pólos regionalizados, e isso vai ter um papel muito importante para voltarmos a acelerar. E recursos humanos é a prioridade das prioridades. Porque só produzindo gente competente, que pesquisa e produz, nós vamos poder avançar na inovação, na ciência e tecnologia no Brasil.

Um comentário:

  1. Um maior investimento no setor de ciência e tecnologia é fundamental para desenvolver nossa economia.Vivemos em uma época que a ciência e a tecnologia fazem parte do nosso dia-a-dia, e o investimento nesse campo sem dúvida trará grandes benefícios para o Brasil.

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