terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Entenda o que há de estranho por trás do absurdo aumento da tarifa de ônibus em SP

O presente do Prefeito Gilberto Kassab (DEM) para a população paulistana neste final de ano veio na forma de um absurdo aumento da passagem de ônibus a partir do próximo dia 5 de janeiro. Nesta data, os usuários de ônibus da capital paulista terão que desembolsar R$ 3,00 para a passagem, o que corresponde a um aumento de 11% frente à tarifa atual, que é de R$ 2,70. Esse reajuste corresponde a uma elevação real de mais de 5%, uma vez que a inflação registrada em São Paulo em todo o ano de 2010 ficou em 5,84%, de acordo com o IPC (Índice de Preços ao Consumidor) da Fipe.

O último reajuste, ocorrido em janeiro desse ano, quando a passagem subiu de R$ 2,30 para R$ 2,70, era até justificável, já que a tarifa do ônibus urbano havia ficado inalterada nos três anos anteriores. A elevação anunciada nesta terça-feira, 28, ao contrário, é totalmente descabida, uma vez que, além de ocorrer numa proporção equivalente a quase o dobro da inflação verificada na região metropolitana de São Paulo, causa estranheza em função do aumento colossal dos subsídios previstos para 2011. Isso é totalmente desconexo, uma vez que se os subsídios crescem, o natural seria que a tarifa não registrasse aumento ou crescesse em proporção menor.

Subsídios da Prefeitura atingiram R$ 600 milhões este ano
Para quem não sabe, todos os meses a Prefeitura, por meio da SPTrans, transfere uma quantidade de recursos (subsídios) para as empresas de ônibus que operam o transporte na capital. Esses valores são destinados a cobrir as gratuidades do transporte coletivo, como aquelas oferecidas aos idosos e a meia-passagem para estudantes. Assim, uma parte das despesas da SPTrans é coberta com recursos obtidos na catraca, com a venda de bilhetes, e a outra parte vem na forma de repasses da Prefeitura previstos no orçamento. Somente neste ano, a Prefeitura repassou R$ 600 milhões em subsídios para as empresas de ônibus, o que representa 13% dos custos totais do sistema de transporte da capital.

Esse volume de subsídios estourou em muito a previsão orçamentária para este ano, que destinava, em sua versão original, apenas R$ 360 milhões em repasses para as empresas de ônibus. Contudo, esse volume foi estourado já em julho, quando os subsídios da Prefeitura fecharam aquele mês em quase R$ 383 milhões. A partir de então, o prefeito Kassab começou a remanejar recursos de outros projetos (como a construção de novos corredores e terminais de ônibus) para cobrir as necessidades de transferências para as empresas de transporte coletivo. A Secretaria de Transportes alega que esses recursos “extras” seriam utilizados não somente na compensação da gratuidade mas também na renovação da frota de ônibus.

É preciso dizer aqui que isso é muito difícil de confirmar, uma vez que desde o ano passado a Prefeitura deixou de diferenciar o que representa transferências a titulo de renovação da frota e o que se refere a compensações de gratuidades. Desde então, todas as transferências da Prefeitura para as empresas de ônibus são feitas sob a rubrica “compensação tarifária”. Além disso, qualquer pessoa que ande de ônibus na capital paulista não consegue ver de fato essa “renovação da frota” apontada pela Secretaria de Transportes para explicar os subsídios extras repassados às empresas de transporte coletivo. Vale dizer, inclusive, que os próprios dados da SPTrans não indicam um aumento da frota nos últimos anos.

Tarifa cresce mesmo com aumento dos subsídios
Para 2011, o prefeito Kassab destinou inicialmente R$ 600 milhões na peça orçamentária enviada à Câmara Municipal para serem gastos em subsídios, o que corresponde ao mesmo valor executado esse ano (vale lembrar, contudo, que na comparação com o Orçamento aprovado para 2010, esse valor é 67% superior). Como os subsídios repassados pela Prefeitura não deveriam ter aumento (se comparados à execução orçamentária deste ano), a Secretaria de Transportes admitia um aumento no valor da passagem para R$ 2,90. Ou seja, a expectativa era que a passagem subisse 7,4% frente a uma inflação projetada para o ano de 5,5%, representando, assim, uma elevação real de 1,9%.

Contudo, diversas emendas aprovadas na Câmara dos Vereadores elevaram os recursos direcionados a subsídios para R$ 743 milhões em 2011, o que corresponde a um valor 24% maior do que aquele repassado esse ano às empresas de transporte coletivo. E aí está a grande estranheza: mesmo com os subsídios orçamentários sendo aumentados em uma proporção descomunal de 24%, a Prefeitura anunciou um reajuste no valor da passagem de ônibus ainda maior do que o previsto inicialmente, chegando aos R$ 3,00. Ora, se os subsídios cresceram nessa magnitude, o mais razoável seria manter a tarifa ou, ao menos, elevá-la numa proporção inferior à casa dos R$ 2,90 e não aumentá-la para 3,00!

Esse aumento, segundo argumentação da Prefeitura, decorre de um estudo feito pela Secretaria de Planejamento Econômico, Orçamento e Gestão a partir de planilhas elaboradas pelas empresas de ônibus. Nessas planilhas, as empresas projetam seus custos para o próximo ano e a partir daí é definida a parte que será coberta pela Prefeitura (subsídios) e de quanto será o reajuste tarifário. Como é plausível pensar que a estrutura de custos das empresas, sob condições normais, não tenha aumentos explosivos, se os subsídios crescem, a tarifa pode ser “segurada”. Agora, esse aumento de 11% na tarifa não obstante a um crescimento de 24% dos subsídios soa muito estranho.

Para justificar essa situação, ou as empresas de ônibus estão projetando uma redução muito grande no número de passageiros transportados (o que é impensável) ou elas projetam um crescimento muito grande das despesas correntes e de capital no próximo ano. A não ser que as empresas de ônibus estejam planejando aumentos significativos nos salários de seus funcionários ou ainda planejando uma renovação em proporções colossais de suas frotas, não tem justificativa o fato de a passagem ser reajustada em 11% quando os subsídios da Prefeitura cresceram 24% para o período! Ficaria mais fácil entender isso se a Prefeitura disponibilizasse para consulta pública o tal estudo da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão junto com as planilhas das empresas de ônibus. Mas como transparência não é o forte dessa gestão, parece que pedir a divulgação desses dados é um pouco demais.

2 comentários:

  1. Você disse tudo. Não tem mais oq dizer. Isto é um exemplo da ridicula gestão que São Paulo enfrenta com o PSDB. Queria mesmo ver alguem do governo tentando defender o aumento. Mas eles não precisam, porque ninguem ta nem ai.

    Vale dizer que há uma movimento contra o aumento da passagem, e haverá uma manifesação dia 13/01. Não sei se é do seu interesse divulgar.

    Parabens pelo post.

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  2. Um pouco da manifestação...

    http://www.youtube.com/watch?v=dDOm6g2V3ds

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